Muitos condomínios vedam na convenção a existência de república em prédios
Uma questão polêmica é a constituição de república em condomínio, que é caracterizada pela convivência de três ou mais estudantes ou pessoas sem parentesco em uma unidade. Mas, conforme sua composição, torna-se um desafio definir se é república, especialmente quando há parentesco entre os membros. Muitos condomínios vedam na convenção a ocupado de apartamentos por república, pois temem que os jovens venham a realizar festas constantemente ou que possam criar problemas decorrentes de comportamento rebelde. Assim, firmou-se a ideia de que gera incômodos.
Em geral, os Tribunais entendem que se consta cláusula na convenção que proíbe, não poderá então haver república naquele condomínio. Entretanto, quando a convenção é omissa cria-se a possiblidade do Poder Judiciário indeferir o pedido de sua retirada, caso essa não ocasione perturbação ao sossego.
Lei e convenção permitem restringir uso do apartamento
O direito à tranquilidade no condomínio é assegurado no artigo 1.336 do Código Civil: “São deveres do condômino: IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes”.
Diante disso, caso o condomínio deseje realmente impedir que um apartamento venha a ser ocupado por uma república e outros tipos de atividade, deve atualizar e inserir na convenção as restrições de forma a definir que as unidades serão unifamiliares.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao julgar uma ação proposta por um condomínio contra uma senhora que alugava os quartos para estudantes, entendeu que não deveria proibir a república por não haver desvio da finalidade, no caso, residencial e por inexistir registros de perturbação ao sossego. Este caso evidencia que cabe aos condôminos constatar se a convenção está bem redigida.
Como advogado participei de uma assembleia num condomínio que tem 358 apartamentos, onde há uma linda área de lazer, que se parece com um clube. Presenciei o síndico afirmar que tinha apartamento de 2 quartos onde constava o registro de 17 moradores. Certamente, a piscina, a sauna e as quadras não foram projetadas para esse volume de ocupação, o qual acarreta maiores despesas com água, com o uso dos elevadores e os serviços.
Na Apelação nº 743.859-1, os desembargadores do TJPR decidiram manter sentença que proibiu o proprietário alugar sua unidade para estudantes, pois havia proibição no regimento interno do condomínio. Vejamos um trecho do acórdão que confirmou que vedar república não fere o direito de propriedade: “Isto porque, além de tratar-se de pequena limitação ao direito de propriedade, este direito sempre sofrerá ponderação quando diante de outros valores jurídicos postos em consideração, tais como o sossego, a convenções particulares e a dignidade da pessoa humana que devem ser resguardados nas relações de vizinhança”.
Convenção omissa pode gerar prejuízos
Há algum tempo um síndico me consultou para requerer a retirada de uma Delegacia de Polícia que recebia presos até de madrugada, que foi instalada na loja de um prédio na zona sul. Tiveram outros reclamando da loja que foi locada para uma funerária e outra para um sacolão que gerou a desvalorização dos apartamentos de luxo.
Expliquei que eles não poderiam fazer nada, pois a convenção era omissa e não proibia a instalação dessas atividades. Se eles tivessem uma convenção bem elaborada não teriam esses problemas, pois os 2/3 dos condôminos poderiam vetar esses tipos de negócio, bem como impedir que um apartamento de 2 quartos fosse utilizado por 17 moradores.
RÁDIO JUSTIÇA DO STF
COMO EVITAR O USO INDEVIDO DA UNIDADE E A REPÚBLICA NO CONDOMÍNIO – Esse foi o tema da coluna de Direito Imobiliário, da Rádio Justiça do Supremo Tribunal Federal, do dia 21/04/15, às 09:30H, no Programa Revista Justiça. Ouça na FM 104,7 Brasília ou no www.radiojustica.jus.br, via satélite para o Brasil e pela internet para o mundo.
Esse artigo foi publicado no Jornal O Tempo.
Kênio de Souza Pereira
Advogado e Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis