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INSTRUMENTOS MUSICAIS: PRAZER DE UNS TRANSTORNO DE OUTROS NOS CONDOMÍNIOS

     Em decorrência da pandemia aumentou o número de pessoas nos apartamentos durante o dia, gerando maior possibilidade dos vizinhos serem incomodados com ruídos que antes inexistiam, já que os moradores estavam trabalhando e as crianças na escola. Por outro lado, há aqueles que gostam de instrumentos musicais e aproveitam o isolamento para aprender, aperfeiçoar ou curtir seu piano, órgão, bateria, guitarra, dentre outros. A maioria das pessoas aprecia música, mas o fato é que no seu lar todos têm o direito ao sossego e à saúde garantido por lei, que no caso do condomínio, é regulamentado pelo art. 1.336, IV do Código Civil, que estipula que o infrator poderá ser multado em até cinco quotas de condomínio.                       

       Tratando-se de apartamentos é necessário avaliar criteriosamente caso a caso, pois é comum as convenções proibirem a utilização de aparelhos de som ou de instrumentos musicais que gerem ruídos que ultrapassem os limites do apartamento.  Há apartamento com paredes e lajes mais espessas que permitem a convivência entre os vizinhos com maior conforto acústico. Entretanto, não podemos ignorar que há inúmeros edifícios, mais novos, com paredes e lajes mais estreitas que permitem que o som provocado pelo instrumento, mesmo que seja tocado com moderação, venha a ressoar na sala do apartamento ao lado, impedindo que os moradores estudem, ouçam um jornal ou vejam um filme. 

Qual direito deve prevalecer? Ao lazer ou o de trabalhar, descansar e ter saúde                       

       A questão é complexa, mas se refletirmos: o direito de um ouvir ou tocar instrumentos musicais é superior ao direito do vizinho que quer estudar, trabalhar, ver um filme e dormir? Logicamente que não! Todos têm em primeiro lugar o direito à saúde, que decorre do respeito ao sossego. Configura um abuso de direito o músico forçar o vizinho a tomar medicamentos para dormir e controlar o estresse decorrente dos ruídos que devem ficar confinados dentro da moradia de quem os provoca. Essa é a regra, que a maioria obedece por questão de educação, por respeitar o próximo, sem ter que ler qualquer lei.

Construtora não corrige defeitos por inércia dos compradores

       Diante das Normas de Desempenho (ABNT-NBR 10151:2019) que exige que os prédios, a partir de 2015, tenham conforto térmico e acústico, cabe aos compradores logo que recebem os apartamentos, conferir se atendem as especificações. Caso, as paredes e lajes sejam impróprias, poderão os proprietários exigir a devida reparação ou indenização da construtora, diante da desvalorização dos apartamentos. Diante do alto custo, somente quando o condomínio é devidamente assessorado por advogado e um perito especializados, consegue provar dos defeitos que a construtora nega ou que, de forma hábil, conduz de forma a gerar a prescrição.

       A poluição sonora, mesmo sendo musical, pode se tornar um tormento para quem está em casa descansando, não tendo ninguém o direito de impedir que aqueles que estão em home office cumpram seus compromissos, os quais são mais importantes que o lazer ruidoso. São vários os danos causados pelos ruídos, dentre eles: falta de concentração, irritação, alteração no sono, confusão mental e até mesmo perda auditiva.  

Bens jurídicos mais preciosos: saúde e a vida                       

      Existindo um conflito entre o vizinho que tem o direito ao sossego e às condições que lhe permitam trabalhar e outro que deseja tocar seu instrumento, caso os sons provocados por este atinjam o apartamento ao lado, deverá o músico fazer o tratamento acústico do local, havendo vários recursos como a forração e o revestimento das paredes, portas e janelas acústicas. Mas, se não deseja fazer tal investimento, deverá se abster de fazer barulho.  Apartamento não é estúdio de som, não é clube ou local apropriado para dar aula de música, pois não e um local isolado e distante de outras moradias. Faz parte de um edifício, com o compartilhamento de espaços comuns, onde respeitar o próximo é essencial para conviver. Aquele que não entende isso deve residir em casas, com terrenos amplos e divisas distantes.                       

       Se a pessoa entende ser tão importante escutar música, deve investir no seu lazer, de maneira a não adoecer o vizinho que tem direito de dormir, pois os constantes aborrecimentos agridem a saúde, sendo este o bem jurídico mais valioso e protegido legalmente.

 

Esse artigo foi publicado no Jornal Hoje em Dia

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis

Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG

Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário

kenio@keniopereiraadvogados.com.br