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LEI PODE ELIMINAR DISTORÇÕES DOS PREÇOS DOS ALUGUÉIS

 AÇÃO REVISIONAL CORRIGE OS PROBLEMAS DO IGP-M E DA PANDEMIA

   A crise provocada pela pandemia tornou crítica a situação dos locatários que perderam seus empregos ou tiveram seus rendimentos reduzidos em decorrência de inúmeras empresas terem sido impedidas de funcionar em decorrência da necessidade de distanciamento social para evitar o Covid-19. A situação tornou-se mais grave com a disparada do IGP-M a partir de 2020, sendo que no período de abril/20 a março/21 acumulou a alta de 31,10%, ou seja, cinco vezes o INPC/IBGE que nos últimos 12 meses acumulou 6,10%, sendo este o índice utilizado pelo governo federal como referência da inflação oficial.

   Diante desse cenário e com o crescimento do homeoffice, milhares de locações foram encerradas, aumentando a oferta de lojas, galpões, andares corridos e salas, resultando na redução dos valores das locações comerciais. Por outro lado, inúmeros locatários com contratos de locação de longo prazo, que investiram no pagamento de luvas pelo ponto comercial, em obras para adaptar o imóvel à sua atividade, e que não podem se mudar sem que ocorra um grande prejuízo, se veem em dificuldade quando o locador não abre mão de aplicar o IGP-M integralmente.

   Com o objetivo de solucionar esse impasse, a Câmara dos Deputados está analisando, em regime de urgência, o Projeto de Lei nº 1.062/21, que oferece uma solução que afronta o ato jurídico perfeito, pois ignora que os mais de 13 milhões de contratos de locação residenciais e 5 milhões comerciais estabelecem, na sua maioria, o IGP-M como índice de reajuste, o qual também reajusta os seguros de saúde, as tarifas públicas, dentre outros contratos. No Brasil, a lei não pode retroagir, ou seja, o PL nº1026/21 está fadado ao insucesso por ferir a Constituição Federal que determina no art. 5º, “XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

   O PL nº 1.026/21 estabelece que: “O índice de reajuste previsto nos contratos de locação residencial e comercial não poderá ser superior ao índice oficial de inflação do País medido pelo IPCA, ou outro que venha substitui-lo em caso de sua extinção. É permitida a cobrança de valor acima do índice convencionado, desde que com anuência do locatário.”

 PROJETO INTERFERE NAS RELAÇÕES PRIVADAS E GERA DESCONFIANÇA QUE AFASTARÁ O INVESTIMENTO

   O projeto afronta a lei do mercado, que hoje favorece os locatários diante da ampla oferta de imóveis vazios a preços acessíveis. Entretanto, seu autor, o Deputado Federal Vinícius Carvalho (Republicanos-SP), parece desconhecer essa lógica, pois afirma que é defensor “da livre negociação, mas também não pode deixar o lado mais fraco, no caso o locatário, à mercê das regras do mercado”. Tal ideia ignora a realidade de que mais de 80% das locações geram renda para o locador que tem apenas um imóvel, sendo que o valor recebido serve como aposentadoria para pagar as despesas básicas desse proprietário que, muitas vezes, tem uma condição financeira inferior à do locatário, especialmente nos casos das locações comerciais.

   O PL 1.026/21 protege em excesso o locatário e ao mesmo tempo deixa o locador à mercê do locatário que pode optar por não pagar a correção que venha a superar o IPCA/IBGE, ou seja, consagra o direito deste descumprir o contrato que foi firmado prevendo o IGP-M, mesmo que a aplicação dos 31,10% resulte num aluguel abaixo do valor de mercado. Isso, não é nada racional, pois favorece o abuso por parte do locatário que deseja levar vantagem no caso do aluguel defasado.

 SOLUÇÃO DEVE FOCAR O DIREITO DE PAGAR O QUE É JUSTO

   O Projeto de Lei nº1.026/21 é inócuo, pois cria outro desequilíbrio que prejudica o locador, que dependerá da boa vontade do inquilino em aplicar qualquer percentual superior ao IPCA, mesmo que o aluguel reajustado fique bem abaixo do preço de mercado, fato esse que acontece até com a aplicação do IGP-M em vários casos. Essa regra, de limitar o reajuste a determinado índice, só poderia ser aplicada nos contratos de locação firmados após a sua entrada em vigor. Da forma que está redigido é inconstitucional por afrontar ao contrato já firmado que prevê a aplicação do IGP-M, pois lei posterior não pode alterar o que foi anteriormente pactuado.

   O problema não é o IGP-M, que disparou recentemente em decorrência da variação cambial e da alta das commodities, sendo que esse índice, como os demais, varia de tempos em tempos em decorrência de diversos fatores. Em vários anos o IGP-M ficou abaixo da variação anual do IPCA/IBGE e nem por isso aqueles que pagaram a mais, com base no IPCA, reclamaram. Vejamos os dados:

                                                     

                                IPCA/IBG             IGP-M/FGV
2017 2,95% (-) 0,52%
2015 10,67% 10,54%
2014 6,41% 3,69%
2013 5,91% 5,51%
2011 6,50% 5,10%
2009 4,31 (-) 1,72%

       

   Basta verificar que nos anos de 2009 (-1,72) e 2017 (-0,52) a variação anual do IGP-M ficou negativa. Em 2011, 2013, 2014 e 2015 o IGP-M subiu menos que o IPCA.

PROJETO DE LEI QUE SUGERIMOS IMPEDE QUE ALGUÉM LEVE VANTAGEM

   Elaboramos a solução que consiste em eliminar o aumento que supere o valor de mercado, pois o correto é o locador ter seu capital remunerado adequadamente e o locatário não arcar com o valor acima do que pedido para as novas locações. Enviamos para o Senador Carlos Viana a fundamentação do projeto de lei, bem como os dispositivos, que, sendo aprovados, serão incorporados ao artigo 19 da Lei do Inquilinato. Basta o legislador autorizar a Ação Revisional de Aluguel de imediato, na região que teve impacto em decorrência da pandemia ou catástrofe, com procedimentos processuais rápidos e técnicos para coibir a cobrança de valor que se revela abusiva. A anomalia pela qual todos passamos não justifica esperar 3 anos para revisar o valor que está fora da realidade diante de fatores que ninguém poderia esperar.

   No dia 06/05/21, na nossa coluna às quintas-feiras, do Jornal O Tempo, publicaremos o texto do projeto que sugerimos, que eliminará qualquer desequilíbrio. Sendo aprovado, resultará na manutenção das locações e estimulará o investimento no setor em decorrência da segurança jurídica, devendo o legislador evitar a interferência do governo nas relações privadas e os casuísmos que geram desconfiança com a “quebra de contratos”.

 

Esse artigo foi publicado no Jornal O Tempo.

 

Belo Horizonte, 22 de abril de 2021.

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Conselheiro da Câmera do Mercado Imobiliário de MG e do Secovi-MG

kenio@keniopereiraadvogados.com.br