voltar

CORREÇÃO E JUROS MENSAIS LESAM CREDOR JUDICIAL

     Milhares de processos judiciais demoram anos até que o credor consiga receber do devedor, sendo comum este tumultuar o pagamento da dívida ao insistir em quitar o valor com base no cálculo fechado no 30º dia do mês passado, ou seja, se recusa a atualizar os juros e a correção monetária pro rata die – em relação a fração dos dias transcorridos após o mês anterior.

     De maneira maliciosa, o devedor, após forçar o credor a ter despesas para propor um processo judicial e, além disso, utilizar expedientes inconfessáveis para protelar o andamento da ação, no momento de fazer o pagamento, deixa transcorrer até 29 dias para realizar o depósito judicial sem computar os juros e a correção monetária devida por esses 29 dias. Alega o devedor que a lei estabelece que os juros de 1% ao mês e a correção monetária são mensais, ou seja, só alteram de 30 em 30 dias, e assim procura obter vantagem ilícita, ao pagar menos do que seria o correto, sendo lógico que a inflação e a defasagem da moeda ocorrem diariamente.

 Cumprimento de sentença pode determinar atualização diária

     Deixar de computar os dias em atraso pode ocasionar prejuízo expressivo para o credor, especialmente, nos casos de pagamento de indenizações decorrentes de desapropriações, servidões, da venda de imóveis, dentre outras que atingem elevada quantia. A polêmica pode deixar de existir, bastando os magistrados estipularem nas sentenças e acórdãos que o débito judicial seja atualizado diariamente, até o dia que for efetuado o depósito na conta judicial. Entretanto, a maioria das sentenças e acórdãos deixa de detalhar que a correção e o juros devam ser aplicados na fração dos dias que não completam um mês, sendo que a falta desse detalhamento dá margem para alguns devedores tumultuarem no momento do cumprimento da sentença, o que acaba gerando mais trabalho para o Poder Judiciário.

     Todavia, na prática, há várias decisões judiciais que esclarecem que o Juiz da execução pode definir a aplicação pro rata die sem qualquer problema, não sendo necessário a sentença ou o acórdão detalhar que o cálculo seja pro rata die, o que se mostra mais justo, pois respeita os princípios da isonomia e da proporcionalidade. Cabe ao contador judicial realizar o cálculo pro rata die, em qualquer processo, por uma questão de bom senso e lógica, para evitar o enriquecimento sem causa do devedor, conforme podemos verificar em vários processos judiciais, dentre eles na Apelação Ap. 4001465-65.2013.8.26.0019 TJSP, de 22/02/18: “JUROS PRO RATA DIE”

“Nenhuma impropriedade há no cálculo do contador ao estabelecer contagem proporcional de juros de mora, sobre determinados encargos, quando não se completa sobre ele o período de um mês.

 Nada precisaria ser autorizado ao contador neste tema, pois isso constitui até questão de bom senso, na medida em que se há mora inferior a um mês, a proporcionalidade de juros tem que incidir nesse espaço de tempo inferior”

HÁ DÉCADAS QUALQUER APLICAÇÃO FINANCEIRA OU BOLETO É ATUALIZADO DIARIAMENTE

     Consiste num abuso a pretensão de pagar uma dívida vencida há vários dias, sem atualizá-la diariamente, pois há décadas, qualquer valor no sistema financeiro é corrigido pro rata die. Basta vermos que a pessoa, ao aplicar num CBD, Fundo de Investimento e até na popular Caderneta de Poupança recebe da instituição financeira rendimentos diários. Dessa maneira, se sacar seu crédito aplicado em qualquer banco no dia 05 receberá um valor, se no dia 10 outro e no dia 12 em diante outro valor maior, pois seu dinheiro é remunerado diariamente. Certamente, o devedor da dívida judicial, ao sacar sua aplicação exige que o banco atualize seu recurso até o dia do resgate, não aceitaria nunca receber o valor fechado no dia 30 do mês anterior.

     A obviedade é tamanha que ninguém, ao pagar atrasado um boleto de uma aquisição de um objeto, a contas de energia elétrica, telefonia, o aluguel, a faculdade, o curso, enfim, as dívidas e compromissos em geral reclama quanto a aplicação pro rata die dos juros e da correção, sendo isso comum nos pagamento realizados espontaneamente. No caso de não ter sido divulgado o índice de correção (INPC, IPCA, IGP, IGP-M, CUB, INCC, IPEAD, etc), no dia do pagamento, basta utilizar como base a variação apurada no mês passado para cálculo da correção proporcional, pois a diferença será apurada depois, conforme o caso. O que não se admite é a má-fé do devedor desejar levar vantagem com o transcorrer dos dias para prejudicar o credor ao lhe pagar fechado no dia 30 do mês passado, ou seja, menos que o devido.  

     Não tem sentido, no caso da dívida, o devedor que tem seu dinheiro aplicado num banco, aproveitar-se da situação e depositar em juízo no dia 20, sem acrescentar os juros e a correção proporcional a esses dias. Trata-se de uma questão que se sujeita à valoração da honestidade, aos princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade previstos até mesmo no art. 8º do Código de Processo Civil, além de alguns dispositivos do Código Civil que prestigiam a boa-fé, a probidade e a função social do contrato.


Belo Horizonte, 03 de julho de 2021.

 

Esse artigo foi publicado no Jornal Diário do Comércio. 

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG

Membro do IBRADIM – Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário

kenio@keniopereiraadvogados.com.br