A compra de um imóvel exige diversas medidas para que o negócio seja seguro e não surjam problemas desnecessários no futuro. Porém, muitas vezes o comprador, principalmente quem é mais simples, pensa apenas em ter o local para morar, sem se preocupar com os aspectos formais. Paga o preço combinado, faz a mudança e tem a sensação de que está tudo certo, pois ninguém questionará sua propriedade, principalmente com o passar dos anos. Acontece que o falecimento desse comprador acarreta problemas aos seus herdeiros, que precisarão regularizar toda a documentação do bem para se tornarem, efetivamente, proprietários, de modo a poder vendê-lo, alugá-lo ou nele residir sem dificuldades.
Há casos em que o comprador de um imóvel evita lavrar a escritura de compra e venda após o fechamento do negócio para não pagar o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e as despesas com os dois cartórios, criando assim uma situação que lhe poderá gerar prejuízo bem maior. Assim comete o erro de deixar de transmitir a propriedade para o seu nome por meio da escritura pública e o seu necessário registro no Ofício de Registro de Imóveis.
Há também os herdeiros que deixam de abrir o inventário logo após o falecimento do familiar para não arcarem com os custos do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD) e com o advogado, o que os coloca em riscos de várias maneiras, favorecendo os conflitos com o uso indevido do imóvel.
Vendedor pode se tornar fiador ou falecer
É possível que o vendedor do imóvel se torne fiador em um contrato de locação após a venda, sendo que se o inquilino deixar de pagar o aluguel, a lei autoriza até mesmo a penhora do imóvel desse fiador. Acontece que o imóvel vendido, formalmente, ainda pertencerá ao vendedor, pois o comprador não registrou a compra quando deveria. Assim, poderá se ver envolvido em uma demanda judicial sobre um débito pelo qual não é responsável, o que acarretará o custo da contratação do advogado para propor os Embargos de Terceiros e evitar a perda do bem.
Esse é apenas um dos vários exemplos de problemas que podem surgir ao deixar de transferir a propriedade para o nome do comprador. Poderá ter o agravamento da situação se um dos vendedores (marido ou a esposa) vier a falecer, pois nesse caso, dependerá da boa vontade dos herdeiros, que poderão ser menores ou acharem que merecem receber alguma coisa para formalizar a transferência do imóvel.
Quanto mais sucessores, maior a confusão
Outro problema comum ocorre quando o comprador de um lote permite que parentes construam casas no mesmo terreno, o que amplia as irregularidades e dificulta ainda mais a solução. São diversos os casos de filhos que constroem suas casas no terreno dos pais, ou de netos que passam a morar em uma dessas casas, junto aos avós, após o falecimento dos genitores.
A situação toma contornos preocupantes com o fato do genro que investiu no terreno do sogro e que diante da separação do casal entende que tem direito a parte do imóvel onde residem os cunhados e os pais da ex-esposa e assim passa a exigir uma indenização.
Imóvel problemático perde 40% do valor
Toda essa confusão é refletida nos documentos do imóvel que, diante da irregularidade, tem seu valor consideravelmente reduzido para venda, pois ninguém pagará o valor de mercado por um bem que não está livre para registro e que às vezes gerará um custo de 40% do seu preço normal para vir a ser regularizado.
Com o passar do tempo e a somatória de problemas, a “economia” feita com não pagamento do ITBI ou do ITCD se torna uma despesa ainda maior e causa muitos transtornos, pois a regularização do imóvel exigirá ainda mais trabalho, sem contar as desavenças familiares que poderiam ser evitadas. Será necessário dar início a todos os inventários não abertos com a transmissão da propriedade até o último sucessor e caso isso não seja possível por algum motivo, restará a usucapião como alternativa. Fato é que será necessário investir em um bom advogado para que este possa encontrar a melhor solução para cada caso, pois somente assim o imóvel se tornará apto a ser negociado no mercado.
Belo Horizonte, 18 de outubro de 2021
Artigo resumido publicado no Jornal Hoje em Dia.
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Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
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