O julgamento do Recurso Especial n° 1.819.075, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), cujo acórdão foi publicado no dia 25 de maio de 2021, trouxe definições que visam eliminar as polêmicas sobre a disponibilização de apartamentos para hospedagem pelo aplicativo Airbnb. O Ministro Luís Felipe Salomão, enquanto relator do processo, havia manifestado entendimento pela possibilidade de uma senhora e seu filho alugarem os quartos de dois apartamentos de um edifício em Porto Alegre (RS) por meio do aplicativo. Porém, o resultado do julgamento foi outro, diante da finalidade residencial do condomínio prevista expressamente pela convenção daquele caso.
A decisão do STJ definiu o contrato entre o proprietário do imóvel que usa o Airbnb e seu hóspede como hospedagem atípica, o que eliminou a tese daqueles que defendiam se tratar de locação de curta temporada, que seria submetida à Lei do Inquilinato que prevê a locação pelo prazo de até 90 dias. Assim, torna-se irregular o uso do Airbnb e demais aplicativos para hospedagens em condomínios com destinação específica para fins residenciais prevista na convenção, sendo as atividades comerciais, como a hospedagem atípica, não autorizadas, conforme acórdão de 76 páginas que expressa a complexidade da matéria.
Prédio residencial não tem estrutura de apart-hotel
As ocupações diárias, com alta rotatividade de pessoas diferentes, além de causarem insegurança aos moradores, geram maior utilização da estrutura do prédio (elevadores, áreas de lazer, portaria, mobília), sendo que a maioria dos edifícios não estão preparados para atender alguns níveis de demanda. Inúmeros são os pequenos edifícios que não têm porteiros, que foram adquiridos justamente por serem mais tranquilos, possibilitando assim um menor custo de condomínio, portanto bem diferentes dos apart-hotéis que tem grande movimentação que é controlada por porteiros e seguranças especializados que acarretam uma quota condominial muito mais alta.
Quando um edifício tem vocação para locação por temporada, o que é comum nas cidades litorâneas, sendo comum existirem mais apartamentos destinados à locações diárias do que apartamentos com moradores efetivos, é prevista esse tipo de hospedagem. Em muitos casos os compradores são turistas, ou seja, desde do início a venda já ocorre com a intenção de locação de curto prazo.
Em regra, a portaria de um prédio residencial não é preparada para funcionar com uma recepção de um apart-hotel, no qual há controle de entrada mais profissional e liberação de chaves, cadastramento de veículos, atendimento de reclamações, controle de encomendas, entre outros. Simples porteiros não se equiparam aos profissionais que atuam numa portaria de um hotel, os quais têm alto custo e treinamento específico para atender o grande fluxo de hóspedes.
Assim, a hospedagem atípica de apartamento ou de quarto não pode ser realizada em condomínios residenciais, exceto se for alterada a destinação do condomínio na convenção. Importante observar que o STJ tratou dessa alteração REsp n° 1.819.075, tendo considerado suficiente para esse fim, o quórum de dois terços dos condôminos, dispensando a unanimidade prevista no Código Civil para mudar a destinação de maneira mais expressiva.
Diálogo é a solução
A principal reclamação daqueles que são contra o Airbnb em condomínios residenciais é a insegurança, mas esse e os outros possíveis problemas podem se resolvidos, sendo ideal que os condôminos dialoguem sobre o assunto em assembleia. Caso aprovem essa modalidade de hospedagem, criar medidas de cuidados e identificação dos hospedes é fundamental para manter evitar conflitos e manter a harmonia condominial.
Belo Horizonte, 1º de novembro de 2021
Este artigo foi publicado no Jornal Hoje em Dia.
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro da Câmara do Mercado Imobiliário de MG e do Secovi-MG
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