A cada dia surgem novas decisões dos Tribunais de Justiça que esclarecem que a quota de condomínio, denominada erroneamente como taxa, não tem qualquer relação com a fração ideal e o valor do apartamento, sala ou loja, pois ela é bem diferente do conceito de imposto. A quota do rateio do condomínio decorrente da manutenção e conservação deve ser dividida entre os apartamentos tipo, térreo ou de cobertura, conforme a sua real utilização ou disponibilidade dos serviços que são prestados nas áreas comuns de forma igual para todos os moradores.
Dessa forma, se todos os moradores dos apartamentos utilizam os porteiros, faxineiros, luz, áreas de lazer e tudo mais que está fora das unidades privativas – seja ela de cobertura ou térrea – de forma semelhante, sendo evidente que esses espaços são conservados em benefício da coletividade, não há razão técnica para utilizar a fração ideal para se cobrar a mais de qualquer unidade. Nenhum unidade tem mais privilégios que os apartamentos tipo, pois todas têm o mesmo direito de utilização dos serviços, o que implica nas perícias judiciais que fundamentam os acórdãos que determinam o rateio igualitário.
Somente se for apurado de forma concreta que alguma unidade provoca maior gasto que a outra, terá o condomínio justificativa para a cobrança a mais sobre a referida despesa, o que implica em manter o rateio igualitário quanto às demais, em especial, os salários e encargos trabalhistas que são os custos mais expressivos do rateio.
Valor do imóvel ou capacidade de pagamento não é base de cálculo
A falta de conhecimento sobre Direito Tributário leva pessoas a acreditarem que se a cobertura paga ITBI no ato da lavratura da escritura de compra e venda e todo ano o IPTU mais caro, deve pagar a mais a quota de condomínio. Grande engano, porque o cálculo desses tributos considera a área do bem multiplicado pelo valor do m² de venda, base essa que define quanto se paga de imposto. A quota que é tratada como taxa, não tem relação com o tamanho da unidade e nem com seu valor venal.
Da mesma forma é errônea a alegação de que se o proprietário da cobertura tem maior poder aquisitivo ou ganha mais deve pagar maior quota de condomínio, pois nesse caso tal regra tributária é aplicável apenas para estabelecer o Imposto de Renda.
Isso está claro na decisão do Superior Tribunal de Justiça, no REsp 541.317, que diz ser legal o rateio igualitário das despesas, pois essas decorrem das áreas externas, ou seja, comuns, tendo 5 Ministros afirmado que “o pagamento dos funcionários, a manutenção das áreas comuns e os encargos tributários sobre essas áreas – beneficiam de forma equivalente todos os moradores, independentemente de sua fração ideal. […] os custos, em sua maior parte, não são proporcionais aos tamanhos das unidades, mas das áreas comuns, cujos responsabilidade e aproveitamento são de todos os condôminos indistintamente.”
Exemplos evidenciam o abuso de cobrar condomínio como se fosse imposto
No Brasil existem 5 tipos de tributos: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais, não tendo nenhuma relação com despesas de condomínio.
Portanto, o que se paga nos condomínios são quotas decorrentes do rateio dos custos de manutenção e conservação, sendo que todos os moradores e condôminos se beneficiam igualmente dos serviços que estão disponibilizados, não podendo ninguém os utilizar de forma exclusiva ou de maneira a impedir igual uso pelos vizinhos.
Cobrar a quota de condomínio com base na fração ideal, o que implica no valor do imóvel, consiste em utilizar a lógica da cobrança dos impostos, configurando uma atitude ilógica. Para exemplificar, citamos o caso do IPVA, pois o carro Corolla de R$150 mil paga R$6 mil de imposto, enquanto o Gol de 50 mil, paga R$2 mil, diante da alíquota de 4%. Entretanto, ambos os carros com a diferença de 200% de preço, pagam o mesmo valor pela gasolina, ao passar pelo pedágio, e ao utilizar uma vaga no estacionamento rotativo.
Se mostra inaceitável o dono de cobertura que tem fração ideal 80% maior que o apartamento tipo, ser obrigado a arcar com quota 80% a mais pelos porteiros, pelo vale transporte e refeição deles, pela faxina e áreas de lazer, pois tais serviços não são prestados a mais para os moradores da cobertura. Quanto o condomínio compra um interfone, cadeiras e mesas do salão de festas, um tapete ou equipamentos da academia, fica evidente a irracionalidade de se cobrar 80% a mais por ter a cobertura fração ideal maior. Pergunta-se: os moradores da cobertura (que muitas vezes tem menos habitantes que várias unidades tipo), utilizam 80% a mais dos serviços dos porteiros, faxineiros, academia e demais áreas? Obviamente não!
Direito de pagar pelo que é colocado à disposição ou utilizado
As perícias judiciais realizadas nas ações que visam derrubar a cobrança pela fração ideal, confirmam ser impossível provar que a cobertura ou o apto térreo gaste mais que os vizinhos, pois todos os serviços e áreas comuns estão à disposição da coletividade da forma igual. O art. 1.335 CC determina isso e de forma científica os peritos judiciais respondem ser incorreto o rateio pela fração ideal.
Em decorrência do estudo desses conceitos há anos as construtoras passaram a estabelecer nas convenções o rateio igualitário, evitando os conflitos gerados pela fração ideal que foi inserida na Lei de Incorporação em Condomínios (nº 4.591/64) no art. 12 para dividir os custos de construção de unidades negociadas na planta, o que é muito diferente do rateio de conservação e manutenção previsto no art. 24 do citado diploma legal.
Belo Horizonte, 18 de maio de 2023.
O resumo deste artigo foi publicado na nossa coluna do Jornal O TEMPO.
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Kênio de Souza Pereira
Diretor em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário – ABAMI
Conselheiro da Câmara do Mercado Imobiliário de MG e do Secovi-MG.
kenio@keniopereiraadvogados.com.br