As recentes normas de acessibilidade são importantes para a melhora da qualidade de vida das pessoas deficientes, sendo que nos termos do Decreto nº 9.451/18, a partir de 26/01/20, os novos edifícios residenciais são obrigados a incluir nos projetos as modificações para facilitar o acesso dos deficientes, em especial, nas áreas comuns dos condomínios. Todavia, as lojas e demais estabelecimentos comerciais que foram construídos há décadas, ou seja, numa época que nem se imaginava a existência de pequenos elevadores, estão tendo um grande problema para serem ocupados por novos inquilinos ou pelos proprietários que solicitam alvará de funcionamento de um novo negócio.
Logicamente, os empresários desejam receber as pessoas com dificuldade de locomoção e a crescente parcela da população idosa, pois merecem toda atenção e consideração. Entretanto, grande parte das lojas antigas, especialmente as de menor dimensão, não possibilitam a instalação de rampa ou elevador, que têm alto custo, e em alguns casos a frente do imóvel não comporta tais obras. Deve-se levar em conta que o inquilino, ao desocupar o imóvel, deve recompor seu estado original para o locador receber as chaves, sendo comum ser dada outra destinação a propriedade.
Diante disso, é inaceitável condicionar a concessão do alvará de reforma ou de funcionamento a realização de obras inviáveis, de forma a forçar o comerciante a desistir de seu empreendimento ou do local onde está instalado bem antes da nova lei. O imóvel está legalizado, pois possui Habite-se de um projeto aprovado há tempos para qualquer atividade não residencial.
Decreto que regulamenta a lei respeita o ato jurídico perfeito
Por uma questão de segurança jurídica, o Decreto 9.451/18, impôs somente aos novos edifícios multifamiliares, a partir de 2020, o dever de implantar a acessibilidade, ou seja, respeitou a Constituição Federal que consagra que nenhuma lei pode retroagir, conforme podemos verificar no o inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição da República:
XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Portanto, seguindo a mesma regra, o alvará de funcionamento deve ser concedido para a empresa em respeito ao direito adquirido e o ato jurídico perfeito configurado pela Baixa de Construção que confirmou ter sido o prédio edificado dentro da norma legal vigente naquele momento. Deve-se atentar também sobre o direito dos milhares de deficientes, que não têm problema de locomoção, que precisam trabalhar nesses locais que podem deixar de existir em decorrência de uma interpretação equivocada dessa lei, devendo ser considerada a questão social do direito ao trabalho.
Lei não pode inviabilizar milhares de imóveis comerciais
Por não ter sido ainda editado o Decreto que regulamentará as edificações comerciais que foram abrangidas no art. 56 da Lei nº13.146/15, cabe aos gestores municipais adotarem a regra do Dec. 9.451/18, que prevê a exigências da acessibilidade apenas para as novas construções em respeito a segurança jurídica, evitando assim processos judiciais. Tais pilares são essenciais ao exercício da cidadania e da dignidade. Uma nova lei não elimina sua aprovação consagrada pela Baixa de Construção. Importante constatar que os empresários e os condomínios têm adotado há anos a acessibilidade, espontaneamente, quando as condições do prédio permitem.
Belo Horizonte, 15 de junho de 2023.
O resumo deste artigo foi publicado no Jornal O Tempo.
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Kênio de Souza Pereira
Diretor em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis