De acordo com o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) existem 83 milhões de processos no Brasil, sendo mais de 65 milhões ações cíveis, isto é, que versam sobre contratos, divórcios, previdência, tributos e etc.
Não é apenas a quantidade de processos que gera a demora no andamento do feito, mas também o fato de que a cada feriado vemos os Tribunais de Justiça emendando dois ou três dias além da data festiva, alterando feriado do final de semana para um dia útil, e ainda, as férias de mais de dois meses dos magistrados.
Como exemplo, citamos a transferência da celebração do dia do servidor público instituído no dia 28/10/2023, um sábado, para um dia útil, a saber o dia 1º de novembro de 2023 (quarta-feira) a fim de viabilizar a suspensão do expediente forense e o fechamento da Justiça Estadual por 3 dias seguidos por como faz prova a previsão da Portaria Conjunta nº1.434/2023 https://www8.tjmg.jus.br/institucional/at/pdf/pc14342023.pdf;
Referida portaria previu, ainda, o fechamento da Justiça Estadual nos dias 14 de agosto (segunda-feira), 08 de setembro (sexta-feira) e 13 de outubro (sexta-feira), sem qualquer fundamentação. Tais datas são próximas a feriados estaduais ou nacionais e entendeu o Poder Judiciário por suspender os prazos nesses dias e, por sua vez, não ter qualquer expediente de forma prolongada.
Tal cenário traduz a inacreditável e real despreocupação com a necessidade dos jurisdicionados obterem resposta de seu direito num prazo razoável e violação do próprio Código de Processo Civil que em seu artigo 4º prevê o direito de “obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”, e, por sua vez, implica na cobrança dos advogados pelos clientes de forma reiterada quanto a resolução de seu litígio, pois a morosidade causa espanto e faz surgir a dúvida sobre o trabalho efetivamente realizado pelo advogado que tinha previsto para seu cliente a solução num prazo razoável.
Reclamações repetitivas dos clientes
Por diversas situações o advogado se depara com ligações diárias, mensagens, e-mails e até clientes que comparecem ao escritório indignados questionando porque o processo não anda. Há casos em que o próprio cliente comparece a secretaria por não acreditar no absurdo que é o processo ficar concluso por mais de um ano ou pior, sem qualquer andamento por meses.
Há caso de processo pronto para ser sentenciado esperando pela decisão há mais de 2 anos; outros foram distribuídos há mais de seis meses e aguardam a expedição do mandado de citação.
Como explicar essa demora para o cliente, se o CPC prevê o que as decisões devem ocorrer no prazo de 5 ou 10 dias, e a sentença ser proferida em 30 dias?
Como explicar que o juiz somente comparece uma vez por semana no gabinete? E que se o advogado peticionar novamente o processo sairá da ordem cronológica e demorará ainda mais para uma simples decisão sair?
O advogado já não sabe mais como justificar para o cliente a inércia que afronta a lei e a expectativa de que seu direito seria levado a sério, eis que a realidade soa como mentira.
Essas reclamações estressam e desestimulam os advogados, especialmente diante da indiferença das secretarias e alguns magistrados. Por isso, muitos advogados decepcionados têm desistido da profissão, pois os honorários que recebe são insuficientes para trabalhar, conforme CNJ apurou, em processos que duram, em média, sete anos.
Magistrados comprometidos em prestar bons serviços
Contudo, é importante ressaltar que no Poder Judiciário a maioria dos magistrados trabalha com grande interesse em atender os jurisdicionados, bem como os advogados, mas a ausência de estrutura, de determinações práticas que gerem celeridade e de pessoal qualificado, os prejudica também. O resultado é o aumento de doenças ocupacionais dos magistrados, tais como o estresse e depressão, o que implica no maior número de aposentadorias antes dos 75 anos.
Além disso, é comum nos depararmos com a frustração dos juízes de 1ª instância ao reconhecer ser impossível julgar com a devida profundidade 8000 processos de temas diversos e, também, dos desembargadores que se deparam com o julgamento de 500 processos por semana em cada sessão decorrentes, muitas vezes, das sentenças dadas sem que se aprofunde no assunto.
Causa preocupação e chega a ser absurdo o número de processos judiciais que são remetidos aos Tribunais Superiores (STF e STJ) que, por sua vez, têm proferido decisões que causam estranheza por não citarem os dispositivos legais que sustentam a decisão – pois jurisprudência não é lei – e por inobservarem a Constituição Federal e que serão objeto de novos recursos aos Tribunais Superiores.
Advogado e população precisam ser respeitados
O advogado se depara com portas de gabinetes fechadas ante a recusa dos magistrados de despacharem o caso, ou ainda, se vê obrigado a despachar com estagiários, fazendo questionar se o seu direito foi cerceado ou se são eles juntamente com os assessores quem, efetivamente, julgam os processos.
Por outro lado, ao aceitarem despachar – como se fosse um favor – são dadas decisões absurdas que, mais uma vez, geram reclamações, sendo erros básicos ignorados nos embargos declaratórios, forçando assim as apelações sobre questões que representam, muitas vezes, o patrimônio de toda uma vida.
Tem sido decepcionante a falta de respeito ao trabalho do advogado, mesmo sendo ele, conforme a Constituição Federal, indispensável à administração da justiça.
Advogar não é profissão para covardes, mas a despreocupação de alguns magistrados tem adoecido os advogados que passaram a ser confundidos com psicólogos diante das aflições dos clientes que têm perdido a fé na justiça.
Belo Horizonte, 11 de dezembro de 2023.
Artigo resumido publicado no Jornal Hoje em Dia.
Acesse o link para baixar o PDF do artigo publicado.
Kênio de Souza Pereira
Diretor em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
kenio@keniopereiraadvogados.com.br