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ATA DEVE CONTER A REALIDADE E NÃO SUA INTERPRETAÇÃO

Deixar para redigir a ata depois para manipula-la pode gerar processo penal

   Apesar da redação de uma ata de assembleia ser necessária no cotidiano de milhares de edifícios construídos pelas cidades, é perceptível que grande parte das pessoas ainda desconhece a noção básica do que deve ser registrado nesse documento, que não deve ser confundido com um relatório que vise relatar fatos passados. O que caracteriza uma ata é o registro atual, simultâneo aos fatos, de forma a reproduzir o que está acontecendo e não o que já aconteceu.

   Esse documento visa registrar as resoluções tomadas relativas ao ocorrido e deve especificar o nome das pessoas participantes, quem presidiu a sessão, a data de sua realização, local, convocação prévia, assuntos discutidos, votação, bem como falas e ocorrências cujos registros são solicitados.

   Muitos conflitos surgem em razão da falta de compromisso com a retratação da realidade de maneira detalhada, o que pode, com o passar do tempo, comprometer o entendimento do que foi deliberado e acabar se tornando um litígio que poderia ter sido evitado.

ALTERAR FALA OU FATO É CRIME

   Os fatos ocorridos em assembleia, bem como as falas ditas pelos condôminos e procuradores participantes devem ser devidamente retratados na ata, sendo que modificar o registro do acontecimento com o objetivo de manipular a realidade ou omitir dados configura o crime de falsidade ideológica, previsto no art. 299 do Código Penal, e quem o pratica, sendo síndico ou não, sofre pessoalmente a sanção penal. Diante da postura do síndico ou de quem mais tenha coparticipado com o ato ilegal, deve ele e o secretário e/ou presidente, arcarem pessoalmente com todos os custos do processo penal que vierem a sofrer, sendo vedado o condomínio pagar qualquer valor para a defesa de quem agiu de forma a ferir os artigos 186 e 187 do Código Civil.

QUALQUER CONDÔMINO PODE IMPEDIR GASTO COM DEFESA CRIMINAL

   Poderá qualquer condomínio contestar e promover uma ação cível contra quem autorizar o gasto irregular com a defesa de quem pratica um crime, pois o síndico ou qualquer pessoa da administração não tem a cobertura do condomínio se agiu de forma maliciosa ou abusiva, evidenciando o excesso de mandado, pois é seu dever agir com boa-fé e evitar fraude na assembleia. Deve, quem praticou o ato ilegal, arcar com todos os danos que provocou conforme artigo 927 do Código Civil, em especial com as custas processuais e os honorários advocatícios para defende-lo como pessoa física. Quem assume a função de síndico ou de presidente ou de secretário de uma assembleia deve agir com seriedade e honestidade.

   Há casos em que, durante a assembleia, um condômino manifesta seu posicionamento e outro discorda, cabendo a quem redige a ata registrar ambas as falas.

   Sendo o caso complexo e sujeito a um procedimento jurídico poderá a manifestação se incluída por escrito ou por meio de um pen-drive, caso a ata esteja sendo digitada no computador. É ilícito, por exemplo, um síndico ou o presidente da assembleia, sendo favorável a um dos posicionamentos opostos, fazer constar em ata apenas a manifestação que apoia ou destacá-la em detrimento da outra. A ata deve ser elaborada no momento da assembleia e deve conter a realidade, não a interpretação realizada pelo redator, sendo a gravação útil para apurar a má-fé deste.

REDAÇÃO DE ATA APÓS A ASSEMBLEIA CAUSA PROBLEMAS

   A maioria dos condomínios tem o vício de fazer um “rascunho” dos fatos tratados para, posteriormente, elaborar a “ata”, atitude essa totalmente irregular e antiprofissional. É natural, mas inaceitável, que a pessoa que assume a obrigação de redigir a ata, caso venha a fazê-lo somente após algum tempo, deixe de colocar expressões ou frases ditas pelos participantes, às vezes por considerá-las inconvenientes, desnecessárias ou até por ferir seus interesses, possibilitando fraudes que podem anular o documento. Fazer a ata posteriormente fere a sua finalidade de registrar, de forma fiel e exata os acontecimentos.

   Uma vez ocorrido o fato, ainda que este seja complicado ou que a maioria dos condôminos discordem, é irregular e desrespeitoso aquele que deixou de cumprir sua obrigação na hora (síndico, presidente e/ou secretário), tendo optado por fazer a redação da ata posteriormente, exigir fundamentos ou explicações para que uma afirmação polêmica que venha a constar na ata assemblear. É preciso entender que o que é dito, independentemente do que é dito, deve ser registrado. Não cabe ao redator da ata escolher o que vai escrever ou contestar, fora da assembleia, algo que foi afirmado. A função de quem elabora uma ata é ser correto e retratar situações verídicas, mesmo que delas discorde.

 

Esse artigo foi publicado no Jornal Hoje Em Dia

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG

Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis

Membro do IBRADIM- Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário

kenio@keniopereiraadvogados.com.br