Muitos síndicos ficam perplexos com a atitude do Corpo de Bombeiros da Polícia Militar (CBPM) em exigir dos condomínios obras que podem atingir R$300 mil para regularização e obtenção do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) que consiste no atestado de que a edificação possui condições de evacuação com segurança no caso de incêndio.
A postura do Corpo de Bombeiros de exigir diversas obras nos condomínios surgiu com a Lei Estadual nº 14.130/01, que dispõe sobre a “prevenção contra incêndio e pânico no Estado”, que art. 9 estabelece: “Esta Lei estende-se, no que couber, às edificações e espaços destinados ao uso coletivo já existentes na data de sua publicação”, ou seja, em 2001.
Por ser esse assunto tratado sem a devida assessoria jurídica, vários condomínios acabam sendo onerados e induzidos a realizar gastos desnecessários e ilógicos, como exigência de refazer toda instalação hidráulica para instalação de hidrante/caixa d’água, portas corta-fogo e obras que somente são exigíveis nas edificações novas.
Razoabilidade
Importante compreender que ninguém pode ferir a Constituição Federal (CF) e nem o “princípio da razoabilidade” ao exigir que os condomínios promovam obras de elevado valor para adequação de um prédio antigo à normas atuais, pois a lei não retroage.
Todavia, é aceitável exigir que sejam realizadas adequações para própria segurança, tais como a instalação de extintores de incêndio, corrimãos ou fitas antiderrapantes nas escadas, pois têm custo razoável e não representam alterações estruturais. Mas, afronta o ato jurídico perfeito, qualificar o edifício que foi aprovado pelo Poder Público como irregular por não atender uma lei que foi publicada após sua Baixa de Construção, documento esse que comprova ser a obra legal, segura e, portanto, habitável.
O CBPM ao exigir obra não prevista no projeto original fere o princípio jurídico da “irretroatividade das leis sobre fatos jurídicos perfeitos”, afrontando a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso XXXVI.
Diferente situação se dá em relação a construções novas, pois nestas devem os construtores atenderem as normas atuais.
Exigências absurdas
Para exemplificar o que o CBPM não pode exigir podemos citar: todos os carros fabricados a partir de 2014 passaram a ter “air bag”, mas seria um absurdo exigir dos donos dos carros fabricados antes de 2013 a instalação de “air bag” ou do freio ABS; ou ainda, determinar que as construções que têm resistência de 150 kg/cm² realizadas até 2009, passem a ter após a alteração da norma em meados de 2010, resistência mínima do concreto de 200kg/cm². Caso o Corpo de Bombeiros exigisse esse reforço nas lajes, todos os prédios construídos antes de 2010 que não observassem resistência mínima do 200kg/cm² teriam que ser reconstruídos, o que implicaria na demolição de quase todos os edifícios da cidade.
Dever da construtora entregar prédio com AVCB
Os compradores de unidades de um condomínio devem exigir da construtora a entrega dos projetos (arquitetônico, estrutural, hidráulico, elétrico, etc) do prédio para poderem se orientar em caso de obras e reparos, bem como o AVCB. A ausência do AVCB é utilizada pela Cia Seguradora (de forma abusiva) para negar o pagamento da indenização no caso de ocorrer um incêndio.
Portanto, muitos edifícios correm risco de prejuízo pela falta de empenho em cobrar da construtora que de forma hábil protela a execução do AVCB para prescrever o direito do condomínio. Este, ao final terá que assumir esse elevado custo por ter deixado de agir juridicamente no devido tempo.
Na maioria dos casos o condomínio só consegue exigir o AVCB da construtora, antes que acabe a prazo de garantia, mediante intervenção de um advogado especializado. Passado esse prazo o prejuízo fica com os condôminos que ficaram inertes, o qual se repete no momento da renovação do AVCB.
Belo Horizonte, 16 outubro de 2023.
Artigo resumido publicado no Jornal Hoje em Dia.
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Kênio de Souza Pereira
Diretor Regional de MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
kenio@keniopereiraadvogados.com.br