A cada dia surgem empresas que vendem fiança, denominadas “Garantidoras”, prometendo aos locadores o recebimento dos aluguéis, IPTU, taxa de condomínio, multa e os reparos do imóvel, até um valor limite pré-determinado, mesmo nos casos em que o inquilino se torne inadimplente. Mas, na prática, não é isso que vemos ao analisar com cuidado os contratos: quando o inquilino atrasa quatro meses, a “Garantidora” se exonera, pois isso é permitido no contrato. Mesmo que o inquilino venha a quitar a dívida integralmente para manter a locação, o locador passa a não ter mais a fiança.
Os locadores ficam surpresos ao perceber que a “Garantidora” é excelente para gerar lucro pra ela e para quem promove esse produto. Entretanto, caso o inquilino não consiga outro fiador no prazo de 30 dias, o locador passa a assumir todo o risco de prejuízos, tendo como opção contratar um advogado para entrar com ação de despejo por falta de garantia, pois dificilmente o inquilino desocupará espontaneamente o imóvel por não ter fiador. E ao conseguir retomar o imóvel, o locador constatará que ficou sem condições de exigir judicialmente do inquilino o pagamento dos aluguéis, pintura e reparos pendentes. É notório que na fase final da locação que ocorre a maioria dos calotes.
Fiança pessoal/tradicional é melhor que a fiança prestada pela garantidora
Esse problema não acontece nas locações garantidas por pessoas naturais que assumem o papel de fiadoras, pois após o inquilino quitar a dívida, inclusive em juízo, essas continuam como garantidoras até a entrega das chaves para o locador. A fiança tradicional, com dois fiadores, tendo um deles imóvel quitado, consiste no melhor tipo de garantia, sendo que em 97% dos casos a fiança permanece intacta até o final da locação.
Todavia, pelo fato da Garantidora se recusar a manter a fiança mesmo tendo o inquilino quitado a dívida, é criada uma situação que força o locador a despejar o inquilino, ficando seu imóvel vazio para obter nova locação, o que pode demorar e trazer prejuízos com a vacância.
Cabe a imobiliária avisar ao seu locador sobre a fragilidade da Garantidora, além das surpresas inseridas nos contratos com quase 30 páginas que são descobertas somente quando acontece a impontualidade, como por exemplo: prazo exíguo para cumprir procedimentos; liberdade da fiadora deixar de ser garantidora quando bem entender, inclusive se o inquilino cancelar o cartão de crédito; multa, juros e pintura como prejuízos não indenizáveis; que se o inquilino impugnar o valor do aluguel/encargos ou realizar sublocação mesmo sem o conhecimento do locador, não há pagamento pela Garantidora, dentre outros.
Imobiliária tem o dever de alerta o locador
É importante os corretores de imóveis e administradoras refletirem sobre o dever de proteger os proprietários que confiam na sua orientação sobre o tipo de garantia adequada.
Tendo o locador sido esclarecido sobre as limitações dessa fiança e aceitado a Garantidora como fiadora, tudo bem! Que seja concluída a locação. Não poderá o locador reclamar depois por omissão ou imperícia da imobiliária se ocorrer prejuízos decorrentes da perda da fiança.
Numa área que abrange tantas leis e que está sujeita a atuação de aproveitadores que se aproveitam do vício das pessoas não lerem contratos longos, impõe o dever dos gerentes e diretores das imobiliárias estudarem as centenas de cláusulas e parágrafos do contrato da Garantidora que contrariam, inclusive, as promessas verbais daqueles que promovem a venda da fiança.
Belo Horizonte, 25 de janeiro de 2024.
O resumo deste artigo foi publicado no Jornal O Tempo.
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Kênio de Souza Pereira
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
Diretor em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário
kenio@keniopereiraadvogados.com.br