O contrato de promessa de compra e venda é primordial para gerar segurança para os contratantes, pois estabelece condições que reduzem as possibilidades de infrações. Por isso, a parte que contrata um advogado especializado para elaborá-lo tem maior segurança, pois o profissional, ao apurar as circunstâncias, motivações e a documentação para montar as cláusulas é capaz de perceber a boa-fé ou a intenção do outro em criar problemas e obter vantagem indevida.
A transmissão da posse do imóvel é um dos pontos críticos, pois pode levar o vendedor ter sérios aborrecimentos se permitir que o comprador entre no apartamento, casa, loja ou terreno antes de quitar integralmente o preço do bem.
Transmitir a posse aumenta os riscos
Em muitos casos, o comprador com grande poder de persuasão se aproveita da inexperiência do vendedor para convencê-lo a lhe dar a posse do imóvel logo após o pagamento do sinal do negócio de valor pouco expressivo, sendo tal atitude temerária, pois o valor adiantado pode ser insignificante caso ocorra o desfazimento do negócio.
O vendedor tem maior controle do negócio antes de dar a posse a comprador, fato esse que se repete com o locador perante o inquilino numa locação. Após entregar as chaves o vendedor ou locador fica à mercê do ocupante que pode tomar atitudes inimagináveis para quem não domina Direito Imobiliário, sendo comum o corretor de imóveis não alertar para esse risco por desconhecer os embates judiciais que têm alto custo.
É fundamental compreender que após a posse, caso o comprador deixe de pagar o restante do valor gerando a rescisão, poderá ocorrer um prejuízo superior a 40% do valor do negócio, pois somente as despesas judiciais superam 20%, além da multa, a comissão de corretagem, fruição e os danos no imóvel.
Comprador mal intencionado chantageia o vendedor
Nos últimos dias, deparamos com uma manobra que nos surpreendeu: o comprador, juntamente com sua esposa, após ter visitado o apartamento por mais de dez vezes e vistoriado um pequeno prédio de 25 anos, fechou o contrato. O apartamento foi comprado vazio, tendo o comprador checado seu estado, bem como do edifício, o qual possuía as paredes da portaria e a fachada desgastadas, necessitando de manutenção e reparos, o que é normal.
Após o pagamento do sinal, o vendedor movido pela boa-fé e ingenuidade emprestou as chaves ao comprador, sendo que pelo contrato, essas só deveriam ser entregues após o registro do contrato de financiamento na matrícula do apartamento. Assim, o comprador entrou no apartamento e passou a realizar verdadeira reforma, quebrando várias paredes, sem a autorização do vendedor.
Ocorre que o comprador, ao conversar com os vizinhos, teve conhecimento de um laudo encomendado poucos meses antes pelo condomínio no qual o engenheiro indicou que o prédio necessitava de manutenção, fato esse visível por qualquer pessoa, dado aos desgastes comuns de um prédio de 25 anos. O laudo, repleto de fotos, deixou evidente a necessidade de pintura, correções de infiltrações nas áreas dos corredores e tetos já vistos pelo comprador, tendo o engenheiro frisado inexistir qualquer problema estrutural.
Qualquer prédio usado necessita de manutenção e reparos
Se trata, portanto, de uma compra comum de um apartamento sem nenhum problema fora da normalidade. Isso porque, da mesma forma que ocorre na aquisição de um carro usado em que será necessário trocar peças no decorrer das manutenções, como pastilhas de freio, pneus, velas, filtros, amortecedores, etc., em um apartamento num Condomínio antigo, existem desgastes comuns.
Contudo, o comprador espertalhão, ao ver o laudo que relatava, apenas a necessidade de reparos comuns em um prédio antigo e sem qualquer relação com o apartamento adquirido, passou a chantagear o vendedor ao exigir um abatimento de R$30mil no preço do apartamento, alegando que teria sido “enganado.”
Esse absurdo decorre da má-fé de alguns compradores que se esmeram em levar vantagem. É evidente que qualquer prédio antigo tem reparos a serem feitos e que caso o comprador desejasse um prédio sem defeitos deveria ter comprado o apartamento em prédio novo, o qual tem a garantia da construtora.
É um grande risco utilizar modelo de contrato, pois esse não abrange a criatividade de pessoas mal intencionadas que se mostram gentis e honestas antes de concluir a transação, mas quando obtém a posse, buscam obter vantagem indevida a qualquer custo.
Belo Horizonte, 6 de março de 2024.
Artigo resumido publicado no Jornal Hoje em Dia.
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Kênio de Souza Pereira
Diretor em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário (ABAMI)
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis