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QUEM PROVOCA AÇÃO DEVE REEMBOLSAR OS HONORÁRIOS PAGOS AO ADVOGADO DO VENCEDOR – (BDI)

   O direito de um implica o dever de outro, que nem sempre cumpre espontaneamente sua obrigação. Os titulares desses direitos frustrados se vêm em uma situação muito desagradável, que se resume no seguinte: tenho um direito, um prazo para exercê-lo e terei que pagar para que isso seja feito. Essa reflexão desestimula muitas pessoas a entrarem em juízo para exigir seu direito por meio de um processo judicial. Os valores a serem despendidos com os honorários de advogado pesam muito nessa decisão, porque pode ser que a pessoa ganhe a ação, ao não ser indenizada pelo valor pago ao advogado, se sinta insatisfeita em decorrência dos gastos que teve para patrocinar o feito.

  Poucos sabem que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decidido favoravelmente ao vencedor da ação condenando o vencido por perdas e danos, determinado que este reembolse os honorários pagos ao advogado para entrar com o processo judicial. Esse é o entendimento do STJ no Recurso Especial nº 1.134.725-MG:

 CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VALORES DESPENDIDOS A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. PERDAS E DANOS. PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL.

  1. Aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra parte com os honorários contratuais, que integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389,395 e 404 do CC/02.

   Esse mesmo entendimento está exposto no REsp nº 1.027.797/M. Essa posição do STJ poderá revolucionar o comportamento dos maus pagadores e daqueles que insistem em desrespeitar os contratos, pois ao penalizar quem perde a causa a pagar os dois tipos de honorários poderá estimular as pessoas e as empresas a cumprirem com os contratos e a quitarem suas dívidas. Mas há de estimular, também, os credores a ingressarem com as respectivas ações.

    NOVO ENTENDIMENTO BENEFICIA QUEM AGE COM HONESTIDADE

   A possibilidade de ser reembolsado dos honorários contratuais beneficiará milhares de credores, dentre eles adquirentes de imóveis, condomínios, locadores, além dos clientes de planos de saúde, de telefonia, bancos e seguradoras, que eram lesados ao não terem de volta essa despesa.

   Certamente os condomínios serão aliviados de um transtorno, pois enfrentam uma situação complicada pelo fato de o valor da quota mensal ser pequena em relação ao custo da contratação do advogado para postular o processo. Por exemplo, no caso de um edifício onde a quota mensal de condomínio gira em torno de R$500,00, é comum a administração deixar acumular entre 12 e 24 meses de atraso da quota para que, no final chegue a ser gerado um débito em torno de R$9.000,00, para justificar pagar ao advogado R$7.000,00, para uma ação de cobrança que pode perdurar em torno de 8 anos.

   A partir do momento que o condomínio insere na convenção que caberá ao devedor arcar com o pagamento dos honorários do advogado contratado para promover a ação de cobrança, veremos que muitos inadimplentes contumazes passarão a pagar em dia sua obrigação.

  Outro seguimento que sofrerá grande impacto com essa nova posição do STJ será o setor de compra e venda de imóveis. No decorrer dos últimos anos, verificamos milhares de processos judiciais movidos por quem adquiriu unidades na planta entregues com atrasos de dois anos, havendo ainda empreendimentos em que não foi executada nem a fundação.

   Diante da perspectiva de que poderá receber de volta tudo que dispendeu – custas processuais, perícia e honorários pagos ao advogado –, o contratante que foi prejudicado ficará mais tranquilo para exigir seus direitos. Por outro lado, a parte que infringe o contrato pensará duas vezes antes de motivar a ação, pois além da probabilidade de ter que pagar a indenização ou reparação, correrá o risco de ter que pagar os ônus da sucumbência, tendo ainda que reembolsar os honorários contratuais que autor do processo pagou ao advogado.

 PREVIMOS ESSA NOVA REALIDADE DESDE 2003

   Desde a entrada em vigor do Código Civil de 2002, divulgamos nosso entendimento de que caberia aos contratantes, inserirem, nos contratos em geral e nas convenções, as previsões contidas nos artigos 389, 395 e 404 do CC, bem como a possibilidade de o condomínio estipular a multa de até cinco vezes a quota condominial contra o inadimplente contumaz, que deve ser somada à multa moratória de 2%, nos termos do artigo 1.337 do CC.

   No artigo “Inadimplência impõe mudança da convenção” publicado no 2º decênio de abril de 2004, no BDI nº 11, afirmamos: Caberá ao advogado especializado em direito imobiliário aproveitar as nuances da nova lei e elaborar normas na convenção que viabilizem a administração do condomínio, cabendo ao Poder Judiciário consagrar essas alternativas com base no bom senso e no princípio da razoabilidade”… Cabe aos advogados especializados discernir na convenção a mora comum que acarreta a multa de 2% do inadimplente contumaz, do condômino que reiteradamente descumpre seu principal dever que é pagar pelo que consome”… Portanto, (com base no art. 1.377 CC) há possibilidade de inserir na convenção multa de até 500% do valor da taxa mensal do condomínio… O novo CC possibilita a interpretação de haver liberdade na estipulação dos juros de mora, ou seja, posem ser inseridos juros superiores a 1% ao mês, bem como determina que o condômino inadimplente arque com os custos do advogado contratado para postular a ação de cobrança.”

   Sempre defendemos a tese de que a pessoa ou a empresa que se recusa a pagar o que deve, que não entrega o que prometeu, que descumpre o contrato a ponto de forçar o credor a contratar advogado, tem o dever de indenizar os custos decorrentes dessa contratação, além dos honorários de sucumbência do processo judicial.

       Ao Julgar o Recurso Especial Nº1.134.725, a Ministra Nancy Andrighi afirmou:

“O Código Civil de 2002 – nos termos dos arts. 389,395 e 404 – determina, de forma expressa, que os honorários advocatícios integram os valores devidos a título de reparação por perdas e danos.

Os honorários mencionados pelos referidos artigos são os honorários contratuais, pois os sucumbenciais, por constituírem crédito autônomo do advogado, não importam em decréscimo patrimonial do vencedor da demanda. Assim, como os honorários convencionais são retirados do patrimônio da parte lesada – para que haja reparação integral do dano sofrido – aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos com os honorários contratuais.

Trata–se de norma que prestigia os princípios da restituição integral, da equidade e da justiça”.

Apesar de nossa orientação de inserir na convenção e nos contratos os preceitos acima citados para facilitar ao julgador condenar a parte vencida ao reembolso dos honorários contratuais, o fato de não constar tal previsão não impede que a sentença determine o referido pagamento.

 DIFERENÇAS DOS DOIS TIPOS DE HONORÁRIOS

    As decisões do STJ definiram as diferenças da natureza dos honorários contratuais e dos sucumbenciais. Os honorários pagos diretamente pelo credor ao advogado constituem um prejuízo material decorrente da mora e do inadimplemento, devendo integrar os valores relativos à plena reparação por perdas e danos, em respeito ao princípio da reparação integral, o qual se encontra nos artigos do CC, possuindo caráter ressarcitório.

 

 A Ministra Nancy Andrighi no Recurso Especial Nº 1.027.797 decidiu:

 

“O princípio da restituição integral se entrelaça com os princípios da equidade, da justiça e, consequentemente, com o princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que, minimizando-se os prejuízos efetivamente sofridos, evita-se o desequilíbrio econômico gerado pelo descumprimento da obrigação e protege-se a dignidade daquele que teve o seu patrimônio lesado por um ato ilícito.” ….

“Os honorários mencionados nos referidos artigos são os honorários extrajudiciais, pois os sucumbenciais relacionam-se com o processo e constituem crédito autônomo do advogado. Assim, como os honorários contratuais são retirados do patrimônio do lesado, para que haja reparação integral do dano sofrido o pagamento dos honorários advocatícios previsto na Lei Civil só pode ser o dos contratuais”.

A ministra fundamenta seu voto com a doutrina de Luiz Antônio Scavone Junior (Do descumprimento das obrigações: consequências à luz do princípio da restituição integral. São Paulo: J. de Oliveira, 2007, p.172-173):

 

“Sendo assim, os honorários mencionados pelos arts. 389, 395 e 404 do Código Civil, ressarcitórios, evidentemente não são aqueles decorrentes do Estatuto da Advocacia, ou seja, os honorários de sucumbência; de outro lado, são pagos diretamente pelo credor ao advogado e constituem em prejuízo (dano emergente) decorrente da mora e do inadimplemento.

Assim os honorários atribuídos a título de sucumbência não se confundem como os honorários ressarcitórios, convencionais ou arbitrados.”

Os honorários ressarcitórios, convencionais ou arbitrados, representam dispêndio do credor e, por essa razão, perdas e danos decorrentes do inadimplemento das obrigações, notadamente em razão da necessidade de contratação de advogado para efetivar o direito de receber o objeto da prestação da relação jurídica obrigacional.

Rompe-se, em razão do ordenamento jurídico, o entendimento corrente, porém equivocado, que decorria do direito anterior, segundo o qual apenas haveria lugar para a condenação do devedor nos honorários de sucumbência.

Não é crível, ante o princípio da restituição integral, que os honorários pagos pelo credor sejam por ele suportados sem qualquer ressarcimento pelo devedor, que a eles deu causa.”

 

   Por sua vez, os honorários de sucumbência, dispostos nos artigos 22 e 23 da Lei n° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) constituem verba autônoma devida pelo vencido diretamente ao advogado da parte vencedora, fixados de acordo com o serviço jurídico prestado.

   É evidente que, se a obrigação tivesse sido realizada na forma e/ou na data convencionada, o credor não seria obrigado a contratar um advogado para tal tarefa. Assim, os gastos com o profissional do direito constituem um dano emergente que não pode ficar sem ressarcimento, pois ninguém paga um advogado para acionar terceiros sem que seja obrigado a fazê-lo.  Não há condenação ao pagamento em duplicidade pelo mesmo fato, ou seja, inexiste o “bis in idem” porque os honorários de advogado decorrem do Código Civil, podendo tanto o contrato quanto a convenção estipularem que tais honorários devem ser pagos ainda que não haja a necessidade de propositura de um processo judicial.

     

Belo Horizonte, 15 de fevereiro de 2016.

 

Acesse o link para baixar o PDF do artigo publicado.

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis de Belo Horizonte-MG.

Conselheiro da Câmara do Mercado Imobiliário de MG e do Secovi-MG.

keniopereira@caixaimobiliaria.com.br –  Tel. (31) 3225-5599