Inércia do fiador pode acarretar perda da sua moradia para quitar dívida do inquilino
Fiador? Ninguém é obrigado a ser um, mas, a partir do momento que aceita ser o garantidor das obrigações de um inquilino, é importante que ele acompanhe se seu afiançado tem cumprido fielmente o contrato de locação. A lei não admite a irresponsabilidade ou o descuido, pois caso o inquilino não pague os aluguéis, os encargos (consumo de água e energia, IPTU e a quota de condomínio, se for o caso) e os reparos e a pintura que são exigíveis no ato da devolução do imóvel ao locador, cabe ao fiador assumir integralmente todo o débito.
Foi pacificado em 2014 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) o entendimento de que o imóvel do fiador, mesmo que seja a sua única moradia, pode vir a ser penhorado e levado a leilão para pagar a dívida do inquilino, com base na Lei nº 8.009 de 1990, que “dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família” que determina:
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
I – em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias;
II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III — pelo credor de pensão alimentícia;
IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.”
STJ respeitou o direito do locador e o estímulo ao mercado
Não se questiona mais nos processos se o fiador pode evitar a perda de sua moradia para pagar a dívida de uma locação, pois o STJ eliminou quaisquer dúvidas ao determinar o leilão do imóvel do fiador, seja ele qual for, pois entendeu que dessa forma beneficia a segurança do mercado de locação, já que raramente o inquilino cria uma situação tão grave para o fiador.
Em geral, uma pessoa só presta fiança para um parente ou para um amigo que lhe transmita muita confiança e a maioria dos inquilinos cumpre suas obrigações contratuais.
Imobiliária reduz risco para fiador
Quando a locação é efetivada diretamente com o locador, ou seja, sem o crivo de uma imobiliária que filtra os candidatos e elimina aqueles que se mostram sem condições de assumir os custos da locação, vemos que o índice de inadimplência gira em torno de 20%. Mas, quando a locação é realizada de maneira profissional, mediante a análise cadastral da imobiliária, a inadimplência não chega a 2%. Devido a isso, é interessante que a pessoa que for procurada para conceder a fiança exija que a locação seja realizada por meio de uma administradora de imóveis experiente, pois essa somente efetivará o contrato após verificar a situação de forma criteriosa, sendo praxe pedir pelo menos dois fiadores com renda comprovada.
Como o fiador pode se resguardar de um prejuízo
Cabe ao fiador, antes de aceitar ser garantidor da locação, analisar se o inquilino terá condições de arcar com o compromisso, especialmente se a locação for comercial, pois qualquer negócio está sujeito a não dar certo. Certamente, se o candidato à locação tem pouco capital para abrir o negócio, se terá que fazer obras e investimentos expressivos, o fiador deve avaliar os riscos, pois o problema poderá passar a ser dele, especialmente no momento da devolução do imóvel ao locador em perfeito estado quando do encerramento da locação.
Não deve o fiador ter constrangimento para indagar tudo sobre o inquilino (amigo, parente, colega de trabalho, etc) para evitar surpresas, pois alguns locam imóvel sem refletir adequadamente.
Fiador deve ter atitude para evitar aumento da dívida
O fiador, ao receber uma carta de cobrança da imobiliária, deve agir com rapidez, exigir que o inquilino pague a dívida ou então estimular que o mesmo desocupe o imóvel para evitar o crescimento da dívida, pois no final, o débito e os custos com reparos pode ver a ser cobrados dele. Muitos fiadores, especialmente orientados por advogados inexperientes, simplesmente se escondem do Oficial de Justiça para não serem citados. Outros, por serem inábeis, contestam o processo judicial de despejo, e assim estimulam a permanência do inquilino inadimplente por meses e até anos na posse do imóvel. O processo de despejo demora mais, a dívida com aluguel e encargos cresce, os danos ao imóvel aumentam e ao final, o débito se torna impagável diante da falta de inteligência daquele que ficou protelando o despejo do inquilino.
No final, o valor é tão elevado que gera a penhora da casa do fiador, sendo essa levada a leilão, mesmo que seja sua moradia. O ideal é o fiador, logo que receber a carta ou um telefonema da imobiliária cobrando o 1º mês de aluguel atrasado, agir com firmeza no sentido de exigir uma solução por parte do devedor.
Desocupação imediata do imóvel
O fiador tem o direito de estimular a desocupação imediata do imóvel, caso veja que o inquilino perdeu a capacidade de pagamento. Há casos lamentáveis, que o inquilino perde a condição psicológica ou emocional de agir, diante de uma separação conjugal, da perda de emprego, de uma falência ou problema de saúde ou familiar e, por vergonha ou constrangimento, omite a situação de inadimplência dos fiadores. Mas isso, não justifica que o fiador tenha que ter sua vida financeira prejudicada, sendo justo que ele procure se unir ao locador e à imobiliária para agilizar a solução, a qual pode ser a desocupação do imóvel para assim poder pagar a dívida num patamar razoável.
Portanto, o fiador deve agir com determinação e, se recebeu um comunicado da imobiliária sobre inadimplência, não deve confiar na informação do inquilino de que está tudo em dia. Cabe ao garantidor assumir o comando da situação, pois caso se omita poderá um dia vir a se arrepender diante do mandado de penhora de seu imóvel. A lei não retira a propriedade de ninguém, mas sim, a atitude negligente do fiador que se omite e não se preocupa em cumprir o que contratou.
Kênio de Souza Pereira.
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis.
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/MG.
Conselheiro do SECOVI- MG e da CMI – Câmara do Mercado Imobiliário de MG.
Representante em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário.