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FALTA DO AVCB COLOCA EM RISCO A SEGURANÇA DE CONDOMÍNIOS

Condomínios são penalizados com o alto custo do AVCB que deveria ter sido entregue pela construtora

     O AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros) aprovado deve ser entregue ao condomínio pela construtora. Diante do fato de ser quase impossível o proprietário de um apartamento, sala ou loja que faz parte de um condomínio ter condições de arcar com a indenização de toda totalidade do prédio no caso da ocorrência de um incêndio, o legislador determinou desde 1964, no artigo 13 da Lei nº 4.591/64, ser obrigatório o condomínio realizar o seguro da edificação, sendo que em 2002 essa obrigação foi reiterada no Código Civil, nos seguintes termos: “Art. 1.348. Compete ao síndico: […] IX – realizar o seguro da edificação”.

     Dessa forma, os condomínios comerciais e residências têm anualmente pago os prêmios de seguros para as Companhias Seguradoras. A legislação estadual da maioria dos estados da federação determina que as edificações coletivas (prédios de apartamentos, salas e lojas), bem como outras construções, conforme classificação realizada pelo Corpo de Bombeiros (que pode ser verificada no site da corporação do respectivo estado), são obrigadas a possuir o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). Sua falta acarreta a autuação do Corpo de Bombeiros, gerando multa e até a interdição do prédio no caso do mesmo não ser realizado.

Segurança contra incêndio

     O AVCB é um documento emitido pelo Corpo de Bombeiros da Polícia Militar (CBPM), o qual pode variar de nome dependendo do estado, sendo que ele certifica que, durante a vistoria, a edificação possuía condições de segurança contra incêndio implantadas e em funcionamento. Dessa maneira, o Corpo de Bombeiros verifica o conjunto de medidas estruturais, técnicas e organizacionais integradas para garantir que a edificação possui o nível adequado de segurança contra incêndios e pânico, conforme previsto na lei. Seu objetivo é preservar a vida dos moradores e ocupantes, obrigando o construtor a edificar de maneira que facilite a evacuação das pessoas. O risco é determinado a partir da análise da edificação considerando a sua área, ocupação e a atividade desenvolvida.

Companhia Seguradora exige AVCB para poder negar a indenização

     Na verdade a maioria dos edifícios no país não possui AVCB, inclusive os prédios públicos. O problema é que milhares de condomínios têm pago anualmente o prêmio do seguro e diante da falta do AVCB existe um consenso entre as Cias. Seguradoras que entendem que poderão simplesmente negar o pagamento da indenização sob a alegação de faltar documentação legal.

     Tal situação gera insegurança jurídica, sendo que é notório que no nosso país há centenas de processos judiciais contra as Cias Seguradoras que procuram desculpas, seja nos mais variados casos (automóveis, roubos, furtos de celulares, incêndios, etc) para deixar de arcar com a indenização ao segurado.

     Ao realizar a apólice de seguro constata-se que a Cia. de Seguros não realiza nenhuma vistoria nos edifícios e nem exige o AVCB e assim criam uma situação ideal para alegarem, no momento que ocorrer o sinistro, que a edificação estava irregular, que a falta dos equipamentos exigidos pelo Corpo de Bombeiros provocou ou agravou os danos e assim procuram justificar o não pagamento da indenização.

Falta de conhecimento dos compradores favorece a construtora

     A maioria dos 5.570 municípios do Brasil não exige o AVCB para conceder a Certidão de Baixa de Construção, também denominada Habite-se. Diante disso, as construtoras averbam as edificações no Ofício de Registro de Imóveis, as vende e entrega os empreendimentos imobiliários coletivos, às vezes, sem fazer as obras e instalar os equipamentos que são exigidos para a aprovação do AVCB.

     Ocorre que esse procedimento fere as leis estaduais que exigem que toda edificação coletiva tem o dever de possuir o AVCB, sendo ilegal o procedimento da incorporadora ou da construtora entregar as unidades e o prédio sem cumprir essa determinação legal que visa garantir a segurança e a vida dos que vierem ali residir, trabalhar ou simplesmente transitar.

Vejam por exemplo a legislação de Minas Gerais:

 Lei 14.130/2001 –“Dispõe sobre a prevenção contra incêndio e pânico no Estado e dá outras providências.”
“Art. 1º – A prevenção e o combate a incêndio e pânico em edificação ou espaço destinado a uso coletivo no Estado serão feitos com a observância do disposto nesta lei. Parágrafo único – Consideram-se edificação ou espaço destinado a uso coletivo, para os fins desta lei, os edifícios ou espaços comerciais, industriais ou de prestação de serviços e os prédios de apartamentos residenciais.

O artigo 2º estabelece que o Corpo de Bombeiro, desenvolverá as seguintes ações:“I – análise e aprovação do sistema de prevenção e combate a incêndio e pânico; II – planejamento, coordenação e execução das atividades de vistoria de prevenção a incêndio e pânico nos locais de que trata esta lei; III – estabelecimento de normas técnicas relativas à segurança das pessoas e seus bens contra incêndio ou qualquer tipo de catástrofe; IV – aplicação de sanções administrativas nos casos previstos em lei. […]”

A Lei 14.130/2001, foi regulamenta pelo Decreto nº44.746/08 que estipula:

“Art. 2º – As exigências das medidas de segurança contra incêndio e pânico das edificações e áreas de risco devem ser cumpridas visando atender aos seguintes objetivos: I – proporcionar condições de segurança contra incêndio e pânico aos ocupantes das edificações e áreas de risco, possibilitando o abandono seguro; II – minimizar os riscos de eventual propagação do fogo para edificações e áreas adjacentes, reduzindo danos ao meio ambiente e patrimônio; III – proporcionar meios de controle e extinção do incêndio e pânico; IV – dar condições de acesso para as operações do Corpo de Bombeiros Militar; e V – garantir as intervenções de socorros de urgência.”

     Para verificar a situação do seu condomínio, basta o cidadão acessar o site do Corpo de Bombeiro do seu estado para conferir a legislação aplicável à sua edificação e consultar se a mesma possui o AVCB.Nos termos do Código de Defesa do Consumidor (CDC), conforme art. 10 “O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança”.

     Portanto, não tem o incorporador e nem o construtor o direito de ignorar as leis que visam propiciar condições seguras de abandono da edificação no caso de incêndio, sendo obrigação da construtora entregar um produto adequado ao consumidor. Conforme art. 12 do CDC, o construtor responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Condomínio tem o direito de exigir AVCB da construtora

     Cabe ao síndico e a empresa que administra o condomínio tomar providências para que o condomínio esteja regularizado, de maneira a reduzir o risco de morte no caso de um incêndio. Diante da inércia do administrador, qualquer condômino tem direito de exigir providências por ter direito de proteger seu patrimônio e a sua vida e de seus familiares.

     Quanto à prescrição para exigir da construtora o AVCB, entende-se que o prazo é de dez anos, nos termos do artigo 205 do Código Civil, pois não se trata de vício de construção previsto no art. 618 e sim do descumprimento de uma lei estadual.

     O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao tratar do tema deixou claro ser obrigação da Construtora Tenda S/A, que agravou a fazer e apresentar o AVCB ao condomínio, ao julgar no dia 24/01/18, o Agravo de Instrumento nº 1.0024.10.149891-3/001, com a seguinte fundamentação:“A construtora agravante possui obrigação de obter o auto de vistoria do corpo de bombeiros (AVCB), bem como o habite-se da obra, os quais visam atestar que a edificação foi construída conforme as exigências legais e está pronta para ser habitada, bem como garantir que a construção seguiu corretamente tudo o que estava previsto no projeto antes aprovado. Desse modo, tenho que se mostra absolutamente adequada e razoável a atribuição à agravante (construtora) do encargo de exibição dos referidos documentos, uma vez que ela é quem detém o conhecimento dos meios adequados e local de requisição destes documentos, notadamente porque foi ela a responsável pela construção do imóvel e, portanto, quem diligenciou e promoveu os processos administrativos perante aos referidos órgãos para a obtenção ao final das autorizações”.

CDC exige edificação que atenda normas de segurança

     Tendo em vista que as leis estaduais exigem o AVCB de forma que as construções possam vir a ser ocupadas com segurança e diante da aplicação do CDC, caracteriza afronta à lei a inobservância dos seguintes artigos:
“Art. 6º São direitos básicos do consumidor: I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos… III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos … sobre os riscos que apresentem;”

     Não pode a construtora elaborar cláusula contratual na promessa de compra e venda que venha a transferir para o condomínio ou adquirente a obrigação de obter o AVCB, pois afrontaria o inciso VI do art. 6º que estabelece o direito do consumidor: “a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou a sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.

     Diante da falta de assessoria jurídica especializada inúmeros condomínios têm assumido custos que variam de R$50.000,00 a R$400.000,00 para realizar as obras, comprar os equipamentos, contratar empresa especializada para elaborar o projeto de incêndio e pânico. A inércia do condomínio resulta no pagamento de multas sucessivas e até na interdição pelo Corpo de Bombeiros.

     O condomínio, ao ser interditado em decorrência da negligência, poderá o proprietário de um consultório ou escritório que for impedido de trabalhar, bem com o lojista, acionar judicialmente o condomínio em busca de indenização pelos danos materiais e morais. Para evitar esses problemas, cabe ao condomínio apurar se a edificação possui o AVCB e, não tendo, exigir da construtora ou arcar com o custo de sua elaboração caso já tenha ocorrido a prescrição.

     A inércia do responsável pelo condomínio, especialmente, no momento da ocorrência de um incêndio, poderá resultar em prejuízo de elevado valor. Poderá a Cia. Seguradora aproveitar-se da falta de providências para criar obstáculos ao pagamento da indenização, podendo ao final, o síndico ou aqueles que deixar de agir virem a figurar como réus para arcarem com os prejuízos que poderiam ser evitados se tivessem agido com cautela e responsabilidade.

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Conselheiro da Câmara do Mercado Imobiliário de MG e do Secovi-MG
Diretor adjunto do IBRADIM-MG Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário
kenio@keniopereiraadvogados.com.br