A relação entre vizinhos pode ser difícil, por envolver pessoas com personalidades diferentes. Porém, há casos em que o comportamento antissocial de um condômino impossibilita o seu convívio com os demais. Nessa hipótese, a lei e o entendimento jurisprudencial fornecem ferramentas para que os condôminos que sofrem com as atitudes do vizinho desequilibrado possam enfrentar a situação.
É comum em condomínio um ou outro morador desrespeitar uma regra prevista na Convenção, como exceder no barulho, estacionar o veículo além do limite da vaga prejudicando a área de manobra, deixar objetos como bicicletas no hall ou entulhos na garagem, permitir que o animal de estimação suje área comum e deixar de recolher seus dejetos. Para esses e outros exemplos boa parte das convenções de condomínio preveem sanções que visam inibir essas práticas, que incomodam e dificultam o relacionamento entre vizinhos, mas por serem eventuais, são suportáveis. Entretanto, há casos em que um único morador comete, sozinho, todas essas infrações, tornando-se o condômino antissocial. Essa pessoa, quando abordada pelo síndico ou por um vizinho para tratar sobre sua conduta, muitas vezes age com agressividade e deixa o ambiente que deveria ser de paz e tranquilidade, insuportável, principalmente em razão das diversas reclamações dos outros moradores.
Em casos como esse a lei permite que o condomínio aplique ao morador com comportamento incompatível com a coletividade, multa de até dez vezes o valor da quota condominial, conforme previsto no parágrafo único do art. 1.337 do Código Civil. Para tanto, quando a convenção não autoriza o síndico a aplicar a multa, é preciso que a aplicação de tal multa seja objeto de deliberação em assembleia, com aprovação de ¾ dos condôminos, devendo ser assegurado ao condômino antissocial o direito de defesa, dando-lhe a oportunidade de apresentar as razões dos seus atos e, se aceitas, reverter a decisão sobre a sanção.
EXCLUSÃO DO CONDÔMINO É POSSÍVEL
Porém, se mesmo com a pesada multa o condômino antissocial insistir nas práticas inadequadas para a vida em condomínio, restará a adoção das medidas judiciais, podendo ser pleiteado em juízo multa mais expressiva, além da reparação por eventuais danos, podendo chegar à exclusão do condômino. Sim, ainda que seja proprietário do apartamento, o morador que agir em desconformidade com o ambiente condominial, de maneira a comprometer o convívio entre os moradores, poderá ser proibido judicialmente de residir no edifício. Embora não haja previsão expressa na lei, julgamentos recentes vêm sendo favoráveis à exclusão do condômino antissocial, como nos casos tratados nos processos n° 1002457-23.2016.8.26.0100, de São Paulo e n° 0031057-42.2015.8.07.0001, do Distrito Federal, dentre outros. Deve-se considerar que nos termos do art. 4° da Lei de Diretrizes das Normas Brasileiras (LINDB), “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Assim, os julgamentos mostram-se apropriados para resolverem um problema que se mostrava de difícil solução.
Pode parecer estranho o proprietário de um apartamento ser obrigado a deixá-lo, afinal, o direito de propriedade é garantido constitucionalmente. Entretanto, quem assim pensa ignora que tal direito não é absoluto, sendo relativizado em circunstâncias nas quais o seu uso indevido provoca danos a outros. Essa situação torna-se ainda mais evidente quando se trata de um condomínio, pois ninguém é obrigado a viver em um prédio, mas se decidir fazê-lo deve se adequar às regras do local ou se retirar.
Portanto, os condôminos antissociais devem rever seus atos enquanto há tempo, pois a consolidação do entendimento judicial que se aponta poderá levá-lo a ser impedido de permanecer no condomínio, sob pena remoção forçada, restando a ele vender o seu apartamento ou alugá-lo.
Geovane Ferreira Pires
Advogado do escritório Kênio Pereira Sociedade de Advogados
Membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/MG