Há 26 anos temos defendido a tese de que as despesas condominiais, por envolverem os custos de manutenção e conservação das áreas comuns do edifício, não devem ser cobradas de acordo com o tamanho das unidades, pois sendo maior ou menor, a área interna não interfere nas despesas “externas”, as quais resultam na quota mensal de condomínio.
Basicamente, o porteiro não trabalha mais para o dono da cobertura porque o seu apartamento é maior, assim como a limpeza das áreas de lazer, da portaria ou das escadas não beneficia mais quem mora no maior apartamento, pois os moradores do apartamento tipo usufruem da mesma maneira. Por isso, a divisão pela fração ideal dos custos das áreas e serviços que são utilizados e disponibilizados a todas as unidades igualmente acarreta cobrança abusiva contra as cobertura e apartamentos térreos.
São diversas as demandas judiciais movidas pelos proprietários de coberturas que buscam seu direito ao pagamento equilibrado no rateio das despesas do condomínio, mas em muitos casos de edifícios com mais de uma cobertura, nem todas agem contra a situação prejudicial. Porém, apenas quem luta merece a vitória, ou seja, pagar o mesmo que os apartamentos tipo.
Há o condômino que encara a questão judicialmente, enquanto outros proprietários de apartamentos maiores optam por nada fazerem. A ideia de algumas dessas pessoas inertes é deixar que o vizinho se exponha sozinho perante os demais, havendo aquelas que acreditam que com o sucesso no processo daquele que enfrentou o problema, serão beneficiados, pois a convenção será modificada para estabelecer um critério equilibrado na divisão das despesas. Contudo, quem pensa assim está equivocado.
Apenas autor do processo paga igualitariamente a quota
O ajuizamento de uma ação é o meio adequado para exercer um direito quando as tentativas de solução extrajudicial são frustradas. Entretanto, quem não se envolve enquanto o outro age, não pode ser beneficiado quando ocorre o resultado positivo.
Na ação para alteração da cláusula da convenção, visando ao rateio igualitário das despesas condominiais, proposta por um proprietário de cobertura em um edifício onde há duas ou mais, quando há a sentença favorável, apenas o autor da ação passa a pagar igual aos condôminos do apartamento tipo. O proprietário da cobertura que não acionou o condomínio continuará a pagar de acordo com a fração ideal.
Esse entendimento consta no acórdão proferido pela 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais no julgamento dos Embargos de Declaração nº 1.0000.15.077503-9/004: “uma decisão judicial, em regra, gera efeitos inter partes, não alcançando assim alegados direitos e deveres de terceiros que não integram a relação jurídica processual.” Na mesma decisão o TJMG decidiu que o valor igualitário retroage ao dia da citação, ou seja, caberá ao condomínio devolver tudo que recebeu a mais do autores no decorrer dos anos de tramitação do processo.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO QUANTO A FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. ACOLHIMENTO. DECISÃO PROFERIDA. ALCANCE A DIREITOS DE TERCEIROS. IMPOSSIBILIDADE. EFEITO INTER PARTES. 1. Existindo omissão quanto à fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais, impõe-se acolher os embargos de declaração, ex vi do artigo 1.022, II c/c art. 85, ambos do CPC. 2. A decisão judicial proferida em ação revisional de cobrança condominial, ainda que reconheça a sua ilegalidade, somente irradia seus efeitos jurídicos sobre as partes do processo. 3. Os pedidos iniciais vinculam o magistrado em suas decisões de mérito. Sendo omisso o acórdão neste aspecto, devem ser acolhidos os Embargos a fim de sanar o vício e fixar o termo inicial dos efeitos da r. decisão colegiada. (TJMG – Embargos de Declaração-Cv 1.0000.15.077503-9/004, Relator(a): Des.(a) Pedro Aleixo, 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/03/2021, publicação da súmula em 04/03/2021).
Donos das coberturas deve se unir para terem os mesmos benefícios
É desafiador eliminar o rateio desequilibrado no condomínio, por ser um processo complexo com diversas etapas, que se mal conduzidas causam grandes desgastes. O principal erro ocorre quando o proprietário da unidade maior, ao se sentir prejudicado tenta resolver o problema de maneira amadora, sem antes contratar um advogado especializado. Na quase totalidade dos casos o proprietário enfrenta situações deselegantes que resultam em atritos que acabam atrapalhando o trabalho do advogado que acabará tendo que assumir o caso futuramente.
A partir do momento que surgir a intenção de igualar a taxa de condomínio, será importante a união entre os proprietários das unidades que pagam valores em excesso. Somente aqueles que entrarem com a ação terão chance de ser beneficiados, sendo que não têm nada a perder se não tiverem sucesso na ação, pois continuarão a pagar a mesma coisa. Entretanto, aqueles que tiverem êxito, serão os únicos a terem o valor da quota diminuído.
Isso ocorre em decorrência do efeito da sentença, que é entre as partes, conforme preceitua o artigo 506 do Código de Processo Civil, “A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros”. Portanto, ao ajuizar uma ação para discutir a cobrança da quota condominial pela fração ideal, é de suma importância que todos proprietários que se sintam prejudicados com a forma do rateio, ajuízem em conjunto de modo a evitar que aconteça como no caso acima mencionado em que somente quem participou da ação será beneficiado com o pagamento da quota igualitária.
Nesse sentido foi o entendimento do TJRS no Agravo de Instrumento nº 70078487279, que limitou os efeitos da decisão judicial àqueles que figuraram no processo.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PEDIDO DE PENHORA ONLINE EM CONTA DE TERCEIRA ESTRANHA AO FEITO. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA E AOS EFEITOS INTER PARTES DA SENTENÇA. I. Nos termos do Art. 506 do NCPC : A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não prejudicando terceiros. Complementado tal disposição, o art. 108 da referida lei processual dispõe que: No curso do processo, somente é lícita a sucessão voluntária das partes nos casos expressos em lei. II. Assim, no caso concreto, não integrando a terceira o polo passivo da lide, de modo que não foi citada ou participou da fase de conhecimento, não há que se falar na constrição de seus bens por força da sentença exequenda. Se a terceira é devedora do executado em processo distinto, o procedimento correto a ser adotado é a penhora no rosto dos autos, e não o redirecionamento da execução em seu desfavor. Negaram provimento ao agravo de instrumento. Unânime. (Agravo de Instrumento nº 70078487279 , Vigésima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dilso Domingos Pereira, julgado em 17/10/2018).
Decisão impede o enriquecimento sem causa
Esse entendimento acertado evita o benefício daqueles que não arcam com os custos do processo, da contratação do advogado e dos honorários periciais. Considerando que apenas um condômino se dispõe a enfrentar o desequilíbrio existente sobre as quotas condominiais, caso o êxito no processo fosse estendido aos condôminos que não agiram, haveria o enriquecimento sem causa destes, que nada pagaram, mas teriam o ganho.
Quem deseja o bônus, deve arcar com o ônus. Por isso, se mostra mais interessante os donos das coberturas se unirem para combater a cobrança abusiva que desvaloriza suas moradias.
Belo Horizonte, 08 de julho de 2021.
Esse artigo foi publicado no Jornal Hoje em Dia.
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis – BH
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