Muitos inquilinos de imóveis residências e comerciais têm arcado com grande prejuízo por ignorar seus deveres contratuais e legais no momento que ocorre a devolução do imóvel ao locador. O art. 23 da Lei 8.245/91 obriga o inquilino a tratar o imóvel como se fosse dele, devendo arcar com o pagamento dos aluguéis e encargos até o momento que entrega as chaves e devolve-lo nas mesmas condições que o recebeu. Pelo fato da maioria dos inquilinos exigir que o locador entregue o imóvel com pintura nova, em reciprocidade, o contrato de locação prevê a obrigação de pintá-lo quando da desocupação, independente do desgaste normal.
Esse pacto é validado pelo Poder Judiciário em decorrência da autonomia da vontade, pois prevalece a liberdade contratual do inquilino que deseja receber o imóvel sem ter que ficar dias pintando e sem poder ocupa-lo, o que resulta no seu compromisso de devolvê-lo de maneira a possibilitar que o locador realize nova locação de imediato.
Compreender as regras da Lei do Inquilinato é fundamental para evitar os riscos do inquilino arcar futuramente com o pagamento de reparos e pintura que deixou de realizar e que podem inviabilizar que o locador realize rapidamente a nova locação.
Aviso prévio para marcar a vistoria
O ideal é o inquilino comunicar com a antecedência de 30 dias sobre a data que entregará as chaves, conforme art. 6º para evitar que o locador ou a imobiliária exija que o inquilino pague o aluguel, IPTU e quota de condomínio correspondente a um mês por falta de aviso prédio. Se o inquilino deseja entregar as chaves, precisa primeiramente avisar para a imobiliária se programar para efetivar a vistoria na data ajustada, que deve ser acompanhada pessoalmente pelo inquilino para que ao final ambos assinem o laudo de vistoria e combinem se há algum reparo a ser realizado para encerrar a locação, conforme estipula da Lei do Inquilinato, nº8.245/91:
Art. 6º O locatário poderá denunciar a locação por prazo indeterminado mediante aviso por escrito ao locador, com antecedência mínima de trinta dias.
Parágrafo único. Na ausência do aviso, o locador poderá exigir quantia correspondente a um mês de aluguel e encargos, vigentes quando da resilição.
Na data que marcar a vistoria com a imobiliária deverá receber o vistoriador com o imóvel desocupado limpo, ou seja, sem qualquer móvel e nas mesmas condições registradas no laudo de vistoria realizado no momento do início da locação, devendo estar quitados o IPTU, contas de água e luz, bem como, se for o caso, a taxa de condomínio.
STJ condena quem entrega imóvel em mal estado
Tem causado preocupação para os inquilinos mal orientados, que se aventuram em depositar as chaves em juízo visando deixar de realizar os reparos dos danos que causou, pois Poder Judiciário tem percebido que, em muitos casos, a ação de consignação é proposta com má-fé, contando o autor com o julgamento equivocado de que o simples depósito das chaves põe fim às obrigações. Grande engano!
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recente julgamento no REsp 1.919.208, que teve a Ministra Nancy Andrighi como relatora, decidiu que para além dos danos emergentes (prejuízo direto da ausência dos reparos), a restituição do imóvel em situação de deterioração anômala enseja o pagamento de indenização por lucros cessantes pelo período em que o bem permaneceu indisponível para o locador. Dessa forma, se o imóvel ficou sem pintura ou com outros itens danificados pela recusa do ex-inquilino em consertar e permaneceu fechado por meses ou anos – diante da demora em realizar a perícia judicial -, caberá ao inquilino e seus fiadores arcarem com o pagamento desses reparos, além dos valores correspondentes aos aluguéis e encargos durante todo o prazo que o locador ficou impossibilitado de realuga-lo.
Essa ação foi ajuizada em 29/4/14, tendo o REsp sido julgado apenas em 20/4/21, ou seja, os Réus ficaram sete anos discutindo uma dívida que cresceu expressivamente e que seria infimamente menor caso tivessem realizado os reparos amigavelmente, de imediato, sem cometer a insensatez da aventura de uma ação de consignação infundada.
No mesmo sentido, quando do REsp 1543773, o STJ entendeu que os aluguéis e demais encargos locatícios são devidos até a data da efetiva entrega. Logicamente, se o imóvel não foi consertado, deixando o locador de aluga-lo por causa dos danos, este terá o direito de receber indenização a título de perdas e danos pelo período que deixou de receber os aluguéis e pelos prejuízos com IPTU e taxas de condomínio. Em muitos casos, esses valores chegam em valores astronômicos, resultando na penhora e no leilão da moradia do fiador, pois essa não tem a proteção do bem de família.
É importante que os fiadores exijam seriedade do seu afiançado, pois o uso malicioso do depósito das chaves em juízo pode comprometer seu patrimônio, já que o contrato de locação prevê que a fiança permanece até a efetiva entrega das chaves, ainda que o prazo tenha sido prorrogado, conforme julgamento do STJ no REsp 1.703.400. Assim, agir com critério e boa-fé gera economia e tranquilidade, devendo os fiadores atuarem com firmeza perante o inquilino para evitar riscos.
Belo Horizonte, 16 de novembro de 2023.
O resumo deste artigo foi publicado no Diário do Comércio.
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Kênio de Souza Pereira
Diretor da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário (ABAMI)
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
kenio@keniopereiraadvogados.com.br