Grandes redes comerciais alugam lojas e galpões em locais estratégicos de forma a ampliar seus pontos de venda e, ao mesmo, tempo inibir que os concorrentes se instalem no entorno, garantindo assim, maior faturamento e valorização do seu ponto comercial. Esses procedimentos agregam valor ao negócio que passa a valer centenas de milhões de reais, gerando transações que envolvem a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) quando é realizada a transferência de gestão ou administração. O fato é que esses tipos de negociações ou parcerias, ao serem autorizadas pela CVM e pelo CADE, não geram nenhum efeito quanto aos contratos de locação que vedam a sublocação. A Lei do Inquilinato, no art. 13 estabelece: “A cessão da locação, a sublocação e o empréstimo do imóvel, total ou parcialmente, dependem do consentimento prédio e escrito do locador”, sendo, portanto, clara a ilegalidade da manobra de alguma rede transferir os imóveis locados para outra rede, mediante subterfúgios, sem que o locador previamente autorize.
É comum nos contratos de locação de drogarias, supermercados, lanchonetes/fast food, agências de turismo/automóveis, hospitais e demais lojas que compõem redes, constar prévia autorização para ceder ou sublocar o imóvel e as obrigações do contrato de locação para outra empresa do mesmo grupo empresarial do inquilino. Essa liberalidade foge à regra, que é proibir que o inquilino transfira para terceiros o imóvel, pois a locação é personalíssima, ou seja, o locador tem o direito de escolher quem irá ocupar seu imóvel.
É RARO O LOCADOR AUTORIZAR SUBLOCAÇÃO
Trata-se de uma exceção, aceitável para aproveitar os grandes espaços locados, como vemos também em hipermercados que, mediante previa autorização do locador, sublocam pequenos espaços do imóvel para farmácia, banca de jornal, chaveiro, floricultura, lavanderia e outras empresas distintas. O foco da locação é o inquilino, mas de forma excepcional, nesta situação rara, figura legalmente como sublocador.
O proprietário do imóvel, nesses casos, permanece tendo a relação jurídica apenas com a empresa que ele confia como inquilina, não tendo contato e nem obrigações com os demais ocupantes, sendo tal relação restrita, impossível de ser estendida em relação à totalidade do galpão para terceiros ou empresa que faça parte de outro grupo econômico.
INFRAÇÃO CONTRATUAL E LEGAL GERA RESCISÃO DO CONTRATO
Diante disso, caso uma empresa ou rede venha a fazer uma parceria com outra que não faça parte do mesmo grupo, que tenha sócios e direções distintas, ao transferir os imóveis comerciais estará ferindo o art. 13 da Lei do Inquilinato ao praticar sublocação ilegal.
São CNPJs e sócios sem qualquer ligação, sendo mais grave a infração se a parceria é realizada entre concorrentes e a bandeira do novo ocupante fará sumir a marca do outro para os clientes. Na prática fica evidente que o ocupante principal do imóvel não é mais a inquilina original, mesmo que exista aprovação do CADE ou da CVM.
Tal manobra poderá evidenciar a intenção de prejudicar outro pretendente, do mesmo ramo, que poderia ali se instalar e pagar luvas e um aluguel melhor para o locador, inclusive mediante participação em percentual de vendas. A infração será mais grave se a locação decorrer do fundo de comércio já existente, como acontece em supermercados, drogaria ou bancos que constroem o prédio para seu uso próprio e que depois realizam a locação com outra bandeira que não prejudique seu nicho de negócios. Caso a inquilina não deseje mais explorar o ponto com a sua bandeira/marca, que o devolva ao locador que criou o fundo de comércio. Não é ético transferir o inquilino transferir o imóvel para outra bandeira que seja rival do locador, pois este poderia vir a preferir ocupar o imóvel para uso próprio.
Essa criatividade de expandir o conceito de “parceria” para burlar a lei, autoriza o locador despejar o inquilino e cobrar a multa rescisória, bem como recusar a renovação do contrato por infringir os artigos 71, II e 72, I da Lei do Inquilinato.
Esse artigo foi publicado no Jornal O Tempo
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG