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LOCAÇÕES EM TEMPOS CATASTRÓFICOS: PROJETO DE LEI N° 1723/2021 IMPEDIRÁ VANTAGEM INDEVIDA NA LOCAÇÃO

      Diante dos conflitos no setor de locações de imóveis em decorrência da pandemia, agravados com o impacto da elevação atípica do IGP-M que acumulou alta de 32,02% no período de maio/20 a abril/21, se faz necessário o enfrentamento da questão de maneira segura, sem a interferência do Governo nos contratos de locação, pois as pessoas têm o direito de escolher livremente os índices de reajuste que melhor atendem seus interesses.

     A Lei nº9.069, de 29/06/95 que instituiu o Plano Real e que regula a economia é clara ao determinar a liberdade dos contratantes escolherem os índices. É inaceitável que políticos casuístas, dissociados dos princípios constitucionais, venham a cria projetos de lei inconstitucionais que afrontem os contratos em vigor, elaborados de maneira legal, conforme podemos verificar. Lei nº 9.069 vigente desde 1995:

     Art. 28. Nos contratos celebrados ou convertidos em REAL com cláusula de correção monetária por índices de preço ou por índice que reflita a variação ponderada dos custos dos insumos utilizados, a periodicidade de aplicação dessas cláusulas será anual.

           1º É nula de pleno direito e não surtirá nenhum efeito cláusula de correção monetária cuja periodicidade seja inferior a um ano.
           2º O disposto neste artigo aplica-se às obrigações convertidas ou contratadas em URV até 27 de maio de 1994 e às convertidas em REAL.
           3º A periodicidade de que trata o caput deste artigo será contada a partir:
               I – da conversão em REAL, no caso das obrigações ainda expressas em Cruzeiros Reais;
               II – da conversão ou contratação em URV, no caso das obrigações expressas em URV contratadas até 27 de maio de 1994;
               III – da contratação, no caso de obrigações contraídas após 1º de julho de 1994; e
               IV – do último reajuste no caso de contratos de locação residencial.

            4º [….]

 O PROBLEMA NÃO SE LIMITA AO IGP-M, POIS EM VÁRIOS MOMENTOS O IPCA O SUPEROU

      Há Projetos de Lei em tramitação na Câmara dos Deputados, como PL 1062 e seus apensos PL 1225, PL 1447 e PL 1538, que abordam somente o aspecto do reajuste ao proporem dispositivos vinculados ao art. 18 da Lei 8.245/91, o que, na prática, beneficiará alguns inquilinos, mas agravará os prejuízos para alguns locadores, resultando em conflitos e no Despejo por Denúncia Vazia. Muitos aluguéis, ainda que reajustados pelo IGP-M, ficam abaixo do valor de mercado, deixando claro que a questão não será resolvida por este caminho.

     Isso, porque esses projetos que impedem a aplicação do IGP-M contêm vícios de inconstitucionalidade, pois propõem mudanças que ferem o ato jurídico perfeito em relação aos contratos já existentes, o que é vedado pelo inciso XXXVI do art. 5º da Constituição da República, que estabelece que nenhuma lei pode mudar o contrato que foi firmado antes de sua vigência.

     Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

     XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

     Há também proposta que limita a liberdade de contratar ao impor o IPCA como único índice na locação, o que interfere nas relações privadas e gera desconfiança. Pelo visto alguns políticos desconhecem que os fatores econômicos que são apurados pelos índices são sazonais, ou seja, em diversos momentos o IPCA/IBGE que é utilizada como parâmetro para medir a inflação, superou a variação anual acumulado pelo IGP-M/FGV:

 

                        IPCA/IBG  IGP-M/FGV
2017 2,95% (-) 0,52%
2015 10,67% 10,54%
2014 6,41% 3,69%
2013 5,91% 5,51%
2011 6,50% 5,10%
2009 4,31 (-) 1,72%

 

NOSSO PROJETO ESTIMULARÁ O ACORDO COM BASE NO PREÇO DE MERCADO

      O PL 1723/2021 insere no artigo 19 da Lei 8.245 cinco parágrafos para autorizar o ajuizamento de Ação Revisional caso uma catástrofe, epidemia ou pandemia atinja expressivamente a localidade do imóvel alugado, de modo a fazer, por mais de três meses, o aluguel superar o valor de mercado. O que deve prevalecer é “a lei da oferta e da procura”, pois essa é que sempre define o valor de mercado do aluguel, tendo como referência os preços de imóveis semelhantes vazios, disponíveis para locação.

Desde 2020, os preços dos aluguéis caíram diante do aumento da oferta, em decorrência da queda do poder aquisitivo e do fechamento de milhares de empresas, em especial, daquelas que foram impedidas de funcionar para atender o distanciamento social. Esse cenário consiste em uma das diretrizes que orientará o direito a ser aplicado em cada situação, deixando de ser problema a elevada alta do IGP-M, pois todos os índices são sazonais, tanto é verdade que o IPCA, no passado, ficou acima do IGP-M em alguns momentos.  

APOIE O PROJETO DE LEI 1723/2021

     O texto do PL 1723/2021 está no site do Senado Federal para consulta pública e pedimos seu voto para apoiá-lo, em prol do entendimento e da segurança jurídica. Acesse o link e participe: https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=148317

     Seus dispositivos permitem que o magistrado arbitre, em caráter liminar, o valor adequado para a locação, de maneira a não prejudicar o locador e nem o inquilino, podendo utilizar a prova técnica simplificada, que é mais célere e simples ou a perícia. O locador, por outro lado, ao ver no processo a avaliação técnica, avaliará os riscos de prosseguir com a ação com maior segurança, sendo estimulado a fazer um acordo para evitar despesas judiciais.

     Dessa forma, as pessoas serão incentivadas a aplicar no mercado de locação, pois terão a segurança de que a liberdade de pactuar e os contratos firmados serão respeitados, gerando assim maior estabilidade nas relações locatícias ao reduzir os litígios e as rescisões dos contratos.

Belo Horizonte, 27 de maio de 2021.

 

Esse artigo foi publicado no Jornal Diário do Comércio.

 
Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis

kenio@keniopereiraadvogados.com.br