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POR QUAL RAZÃO MUITOS ADVOGADOS RENUNCIAM AOS PROCESSOS QUE ENVOLVEM CONDOMÍNIOS? – ADVOGAR PARA CONDOMÍNIO É MAIS TRABALHOSO E DESGASTANTE

ADVOGAR PARA CONDOMÍNIO É MAIS TRABALHOSO, DESGASTANTE E ATÉ ARRISCADO

     As inúmeras diferenças de posicionamento entre os condôminos tornam complexa a convivência, o que é visível nas assembleias. Até temas simples geram discussões calorosas, que às vezes resultam em problemas que perduram por anos, rompem amizades e geram até a mudança de alguns do edifício. Para solucionar essas polêmicas e explicar qual o melhor caminho a seguir, se torna necessário a contratação de especialistas, como um engenheiro ou arquiteto em relação a obras, um contador em relação as contas e de um advogado, com vivencia na área condominial, bem como quanto ao direito de cada um.

 CORAGEM DE TRABALHAR PARA TANTAS CABEÇAS DIFERENTES

     O advogado que atue na área imobiliária, principalmente com condomínios, deve ter inteligência emocional, determinação, nervos de aço, muita perspicácia e know-how para não meter os pés pelas mãos e criar inimizades, além de se queimar diante do fato de, às vezes, um dos condôminos tentar sabotar o serviço por ferir seu interesse. O advogado tem o dever de prestar informações ao seu cliente sobre a estratégia a ser adotada, o andamento do processo e as possibilidades de resultado. Entretanto, deve o causídico lembrar que, ao ser contratado por um condomínio, que pode ter dez, cem ou quatrocentos condôminos que cobrarão e questionarão todo tempo. O problema é a maioria dos advogados não tem a menor condição de atender centenas de indagações, algumas deselegantes. A falta de comunicação clara entre os diversos coproprietários acarreta problemas e desencontros que inexistem quando o cliente é somente uma pessoa. 

     O desafio é tão grande que muitos engenheiros, arquitetos, prestadores de serviços e demais profissionais que fazem orçamento para condomínios se limitam a entregá-lo para o síndico. Se recusam a participar de assembleia, pois surgem questionamentos estranhos, sendo alguns agressivos, às vezes do condômino que desejava que seu parente ou amigo fosse escolhido para fazer o trabalho.

CHOQUES DE INTERESSES COM QUEM SERÁ DEMANDADO

     Quando se trata de aprovar uma ação contra a construtora que deixou de fazer os reparos dos defeitos do prédio, dentro do prazo da garantia, rotineiramente, surge um amigo (ou ex-funcionário, que ninguém sabe) do construtor ou alguém que lhe deve um favor, para inviabilizar os procedimentos, gerar dúvidas, criar obstáculos a ponto de protelar até resultar na prescrição que faz o condomínio perder o direito.  Em vários casos, quando o advogado especializado chega a ser contratado, este constata que foram tomadas atitudes que favorecerem a defesa da pessoa que será ré no processo (um vizinho, o prestador de serviços ou a construtora) devido à má orientação por parte de alguém que tinha algum interesse ou ligação com a mesma, o que aumenta e complica o trabalho jurídico a ser realizado.

RISCO PARA O ADVOGADO RESULTA EM HONORÁRIO MAIOR

     É comum advogado se arrepender em prestar serviço para um condomínio, pois ao passar o orçamento de seu serviço o fez pensando que prestaria o trabalho para apenas uma pessoa, o que é normal. Não imaginou que teria que participar de assembleias tumultuadas, que teria que responder a dezenas de pessoas, algumas que acham que ele não tem nenhum outro cliente, mas apenas o condômino, como se um serviço sustentasse todo o escritório.

     A diversidade de opiniões, os conflitos internos entre os moradores e os choques de informação acabam por inviabilizar muitos escritórios de advocacia, a ponto da maioria adotar como regra não aceitar causas que envolvam condomínios, pois essa situação impõe que o profissional tenha uma equipe, situação essa que exige um honorário maior do que seria cobrado de um único cliente.

 INIMIGO OCULTO AGRAVA O PROBLEMA NO CONDOMÍNIO

     Em alguns casos ocorre boicote e conluio de alguns condôminos para prejudicar o prestador de serviço, que passa a gastar um tempo inimaginável, tendo que ouvir comentários maliciosos, superando enormemente os procedimentos que foram orçados para cobrar os honorários pelo trabalho.  É comum surgir aquele que fala que o filho dele fará mais barato; que o cunhado advogado resolverá o caso ou que o assunto não é complexo e nem urgente. O resultado é o agravamento do problema e do prejuízo com a condução amadora ou motivada por outros interesses.

     Quem tem experiência evita indicar parentes e amigos ao condomínio, pois se a ação der errado, o advogado será taxado de incompetente, havendo casos de o vizinho exigir que ele indenize o prédio pelo fracasso do processo.

 

Belo Horizonte, 27 de dezembro de 2021.

 

Este artigo foi publicado no Jornal Hoje em Dia

 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara de Mercado Imobiliário de MG

kenio@keniopereiraadvogados.com.br