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DESEQUILÍBRIO DE CONHECIMENTO ENTRE CONTRATANTES – INEXPERIÊNCIA E INGENUIDADE RESULTAM EM PREJUÍZOS

   A todo momento vemos pessoas desrespeitando o direito alheio, infringido o que foi contratado e negando o que foi prometido. Há décadas, perdeu-se o sentido confiar apenas na palavra e tornou-se inaceitável deixar de celebrar um contrato em qualquer negociação. Por outro lado, constata-se que inúmeros contratos são elaborados de maneira desequilibrada pela parte que domina o assunto, que se aproveita da experiência para estipular cláusulas que protegem apenas o seu interesse, deixando a outra parte sem qualquer proteção, a ponto de esta ter grandes surpresas e prejuízos no momento que decide exigir o seu direito, o produto ou o serviço que foi pactuado.

   Essas situações totalmente desproporcionais são rotineiras, especialmente nos casos entre: construtora x comprador, empresário x consumidor, inquilino de grande porte x locador, dentre vários outros. A ingenuidade e a credulidade fazem a alegria daquele que inventa regras para impor um modelo de contrato, sendo alguns repletos de termos técnicos, artigos de leis e nuances processuais, que somente advogados que atuam em demandas específicas são capazes de decifrar.

MODELO DE CONTRATO DA EMPRESA

   Aquele que procura impor seu modelo de contrato (pensado e repensado com seu departamento jurídico) se apresenta como um santo, que só diz o que agrada o cliente, que acredita em tudo o que é dito, por se tratar de uma grande empresa. Porém, depois de assinar na pressa e às vezes até sem ler as inúmeras páginas que compõem o contrato, com o passar do tempo, fica surpreso ao descobrir que foi enganado por não ter compreendido o alcance das cláusulas que retiram o seu direito e lhe impõem condições abusivas.   

   Causa perplexidade que, após tantos golpes, a maioria da população ainda acredite nas propagandas e promessas que não são reproduzidas no contrato, o qual, nas entrelinhas, elimina as condições do cliente de exigir o que realmente foi acordado e o motivou a aceitar o negócio.

ORIENTAÇÃO PRÉVIA PODE EVITAR PROBLEMAS  

   Muitas pessoas rejeitam qualquer orientação de um advogado especializado, pois querem acreditar que tudo dará certo e, assim, contam com a sorte ou julgam a outra parte com base em si mesmos, ou seja, “se sou correto e honesto, o outro também é”. Grande engano!

   São ignorados os milhões de processos judiciais motivados por descumprimento das obrigações e pela má-fé daquele que busca levar vantagem a qualquer custo. Na era do WhatsApp, do vício de se escrever o mínimo, a situação tem se agravado diante da “boa conversa”, que lesa milhares de pessoas que perdem o processo por falta de provas (documentos bem elaborados), pois o juiz não tem como condenar com base no achismo ou em reclamações infundadas.

   Em inúmeros casos, o cliente que contratar a assessoria jurídica prévia, acaba evitando a transação ao ser alertado pelo advogado dos riscos que as pessoas comuns desconhecem.

CONSULTA DEVE SER SÉRIA E NÃO UM BATE-PAPO

   Ao ser exigido que cumpra o que prometeu, o infrator se faz de desentendido, utiliza desculpas descaradas e criativas para tentar justificar a lesão. É mestre na protelação e, por saber que as pessoas evitam a Justiça, cria a cada dia novas desculpas, até ocorrer a prescrição, ou seja, a perda do direito de a vítima reclamar. Já o contratante que não refletiu, descobre que aquela dica pelo telefone ou “do amigo que deu uma olhada no contrato”, de nada valeu. Certamente, um bom profissional não analisa um contrato numa rápida leitura, pois isso exige reflexão, bem como o estudo do documento e das circunstâncias que envolvem a transação. Isso requer tempo e expertise, tendo um custo que é bem menor que os prejuízos que podem ocorrer. 

   No mundo dos negócios, que pode envolver até amigos e parentes, não se admite amadorismo, pois no momento em que o outro deseja ou precisa, este é solícito, simpático e faz de tudo para convencer, obter um empréstimo e concluir uma transação. Mas, ao ser cobrado quando descumpre o contrato, muda de comportamento e a amizade e a honestidade perdem o valor, pois o que importa é tão somente o seu interesse.

   Valorize uma consultoria especializada, que realize uma análise neutra e não tenha interesse na transação, antes de assinar um contrato, pois as consequências da ausência desse serviço podem ser prejuízos irrecuperáveis.

 

Belo Horizonte, 07 de abril de 2022.

Este artigo foi publicado no Jornal O Tempo.

 

Kênio de Souza Pereira

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG (2010 a 2021)

Diretor Regional de MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário (ABAMI)

kenio@keniopereiraadvogados.com.br