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CONDOMÍNIO E HERDEIROS PODEM SER VÍTIMA DE USUCAPIÃO E SUPRESSIO

   A regra é que as áreas comuns de um edifício, como por exemplo, portaria, garagem, telhado não podem pertencer somente a uma pessoa (condômino, morador ou terceiro), pois todos os condôminos têm livre acesso às mesmas que fazem parte da fração ideal das unidades. Entretanto, existem situações especiais em que, ao se permitir a utilização de área comum por apenas uma pessoa, de maneira a excluir os demais coproprietários, por mais de dez anos, como fosse dela aquele espaço, poderá o condomínio perder o direito de retomar o referido local. 
                       
   Por inércia ou falta de conhecimento, às vezes o condomínio permite que uma pessoa tome posse de uma área ociosa que pertence à coletividade condominial, pois não precisa da mesma, sendo comum isso ocorrer na garagem, numa lateral ou nos fundos do edifício ou mesmo no telhado.  Ao deixar o vizinho ou até mesmo alguém de fora do condomínio passe a usufruir de determinado espaço de maneira exclusiva por muitos anos, acaba a coletividade por perder a propriedade. 

PERDA DA PROPRIEDADE 

   Nessas situações, é possível que se declare, mediante sentença judicial decorrente de uma ação de usucapião, que o condomínio perdeu a propriedade para o terceiro que usufrui da área (por 5 a 15 anos, dependendo do caso) como se pertencesse somente a ele. O Poder Judiciário poderá entender que a coletividade foi negligente e se omitiu quanto ao direito de impedir que a posse se tornasse ininterrupta e que fosse exercida como se somente aquela pessoa fosse a proprietária. 
                    
   Entretanto, a jurisprudência, de maneira correta, aperfeiçoou o entendimento no caso dessa posse permitida pelo condomínio em prol de um morador, pois não tendo a área comum registro imobiliário distinto, acaba o possuidor integrando o espaço ao seu patrimônio por meio da “surrectio”. Dessa forma, o condômino que passou a ter a convicção de que tal uso não seria impedido, já que o condomínio nunca se queixou por anos, passa a ser o proprietário daquela área comum, resultando assim a “supressio”, que é a perda do direito do condomínio retomar aquele espaço. 
                       
   Por meio de uma decisão judicial ou mesmo no momento que ocorrer uma rerratificação da convenção, poderá ser formalizada a integralização da área utilizada de forma exclusiva ao patrimônio do possuidor, a qual já lhe pertence de direito diante do fato convalidado pelo longo tempo decorrido. O processo judicial visará basicamente obter o reconhecimento formal da área como sua propriedade em decorrência do desinteresse ou da negligência do condomínio, sendo tal fato comum nos edifícios onde existem áreas de garagem encravadas que servem apenas ao proprietário de determinadas vagas.   
                       
   Em alguns casos onde o imóvel possuir matrícula no Ofício de Registro Imóveis e área determinada, será viável a ação de usucapião para adquirir a propriedade, desde que o terceiro exerça uma posse mansa e pacífica do imóvel, sem oposição ou interrupção, pelo lapso temporal previsto na lei que lhe assegure a prescrição aquisitiva (maior ou menor de acordo com a natureza da ocupação). Mas quando se tratar de um condômino utilizar uma área comum por dez anos ou mais, tendo em vista que ele já é coproprietário, esse poderá obter a propriedade exclusiva por meio da “surrectio”, que decorre da perda do direito do condomínio retomar a área em decorrência da “supressio”. Nesse caso, o condomínio poderá evitar custos judiciais com a defesa inócua de um processo declaratório, podendo simplesmente concordar com a inclusão da nova situação na convenção.
 

PERDA DO IMÓVEL HERDADO – USUCAPIÃO ENTRE PARENTES

   A usucapião pode ocorrer inclusive entre herdeiros, pois em uma situação em que os pais falecem e deixam, por exemplo, 5 filhos, considerando que apenas um deles permanece na casa, durante vários anos, dando toda a manutenção no imóvel e arcando com seus impostos e taxas, poderá ficar caracterizado o desinteresse dos demais 4 irmãos, que deixam de ali conviver ou comparecer.  
                       
   Diante de algumas situações especiais, mediante uma assessoria jurídica, este possuidor poderá requerer em juízo a propriedade de 100% da casa e obter o registro imobiliário junto ao Cartório de Registro de Imóveis somente em seu nome, perdendo os demais 4 irmãos 80% do imóvel, diante da omissão e desinteresse.  Há dezenas de casos em que a falta de orientação e de atitude técnica dos herdeiros os levam a perder a propriedade dos imóveis que herdaram, sendo importante alertar que o Código Civil, desde 2003, reduziu os prazos de usucapião, bem como o Estatuto da Cidade, podendo a pessoa vir a perder uma casa ou prédio em apenas 5 anos e qualquer bem móvel, como por exemplo um carro, em apenas 3 anos.                        
                       
   Aprendemos no banco da Faculdade que o “Direito não socorre aos que dormem”, e assim, cabe aos condôminos e herdeiros tomarem providências para evitar esse risco. Se os irmãos desejam deixar a posse do imóvel com apenas um dos herdeiros, basta elaborem um documento com redação técnica para evitar a usucapião.
 
 
 

Kênio de Souza Pereira

Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG (2010 A 2021)

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Diretor Regional em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário

Conselheiro do Secovi-Mg e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG

kenio@keniopereiraadvogados.com.br