Aluguel sem garantia aumentará o calote
A tecnologia seduz com as novidades que são facilmente assimiladas pela população que, às vezes, não reflete sobre as inconsistências e falhas do novo tipo serviço ou produto que lhe é oferecido. Esse fenômeno tem ocorrido com o mercado de locação de imóveis, especialmente diante da oferta que aumentou no “boom” imobiliário que terminou em 2014. Os engenheiros de computação ao perceberem o desaquecimento da economia e o desemprego que atingiu 13 milhões, limitando a capacidade de pagamento dos pretendentes à locação, criaram as “imobiliárias dos inquilinos”, que visam apenas ocupar o imóvel ao atrair quem não tem fiadores ou seguro fiança. Assim, a imobiliária virtual criou o “seu novo jeito de alugar imóveis”.
Na prática, o que tem de novo é o marketing digital agressivo, que ignora os limites da lei ao prometer nas propagandas o que é impossível de cumprir. Basta o proprietário exigir que a imobiliária virtual faça constar no contrato de administração e intermediação, de forma clara que ela assume realmente a garantia de pagar os aluguéis, encargos e danos no caso de inadimplência, sem qualquer limitação e terá como resposta uma negativa. Portanto, há imobiliária que faz de tudo para conquistar o locador, mas não coloca por escrito o que motivou a captação do cliente. Há empresário, especialmente, do mundo virtual, que se julga acima das leis (CDC, Código Civil, Lei nº 6.530/78 e o Decreto nº 81.871/78) que proíbem a propaganda enganosa e a concorrência desleal no exercício da atividade de corretagem imobiliária.
Todavia, esses especialistas em tecnologia, que nunca advogaram na área imobiliária, ignoram que a inadimplência tem aumentado, pois 63 milhões de pessoas figuram como inadimplentes na Serasa, as quais correspondem a 40,3% da população adulta. Somente na Vara especializada em Locações de BH, são distribuídas por mês mais de 200 ações. Agora, imaginem como crescerá com os inquilinos sem fiadores, que não terão constrangimento ao deixar de pagar os aluguéis e os danos do imóvel? Os especialistas do mercado imobiliária sabem que milhares de inquilinos só pagam uma dívida ou os danos do imóvel para evitar perder a amizade dos parentes ou amigos que lhes prestaram fiança.
EM BREVE FALTARÁ IMÓVEIS E OS PREÇOS SUBIRÃO
Constata-se que o mercado começa a reagir e daqui pouco tempo, os preços dos imóveis subirão bem mais que a inflação, pois acumulam uma defasagem desde 2014. Isso sempre acontece, o mercado é cíclico. Veremos locadores tendo inúmeros atritos com inquilinos e sem assessoria para renegociar – pois robôs e e-mails não funcionam numa discussão – haverá aumento dos processos judiciais com alto custo para o locador, especialmente se a imobiliária que lhe presta serviços não possuir um Departamento Jurídico.
Aqueles locadores que realizaram locações sem fiadores ou seguro fiança terão sérios problemas, pois diante da pressão da alta dos preços, muitos inquilinos não conseguirão manter a pontualidade. Ocorrerá a inadimplência que não terá como ser cobrada em juízo do inquilino, já que ele não tem patrimônio apto a ser penhorado. Sem fiadores com condições de arcar com o pagamento da dívida restará ao locador assumir o prejuízo, pois a imobiliária, como de costume, alegará que não é fiadora e nem Cia. de Seguros, sendo apenas uma simples intermediária, bastando conferir no contrato de administração que ela não assumiu o dever de indenizar ou garantir.
LOCADORES VOLTARÃO A ESCOLHER INQUILINOS COM MAIS CRITÉRIO
A demanda por imóveis crescerá com a melhora da renda da população e pelo fato das pessoas mais jovens serem menos patrimonialistas, pois têm preferido alugar para ter maior mobilidade. O locador escolherá com mais critério o inquilino diante dos vários candidatos. Obviamente, não terá sentido abrir mão de fiadores ou de seguro fiança, pois voltará a ter muito mais candidatos de que imóveis vagos, como sempre ocorre de tempos em tempos.
Nessa hora, as imobiliárias virtuais perderão seu apelo porque os locadores mais preparados e inteligentes perceberão que elas não os protege e só beneficiam os inquilinos. Basta vermos as ações de cobrança que o locadores, por não receberem dos inquilinos, são forçados a entrar contra a imobiliária virtual, pois essa em juízo nega que é garantidora, alega que é mera intermediária e que simplesmente aproximou o inquilino do locador, nada mais!
Comparar a locação de um imóvel, cuja relação é patrimonial se prolonga por anos, com o pagamento de valores expressivos, com o uso de um Uber, se mostra absurdo, posto que no Uber o passageiro paga um valor irrisório e logo depois sai do carro encerrando assim a prestação de serviços.
OAB-MG ANALISARÁ OS RISCOS DO MERCADO DE LOCAÇÕES
Para analisar essas questões, a Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG, promoverá o Encontro Imobiliário com o tema “Os Problemas no Mercado de Locações, as Imobiliárias Virtuais e Condomínios”, no dia 16/09/19, às 19h, no auditório da OAB, na Rua Albita, 250 – Cruzeiro-Belo Horizonte. Informações e inscrições no site da OAB-MG.
Esse artigo foi publicado no Jornal O Tempo.
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis
Conselheiro do Secovi-MG e Câmara do Mercado Imobiliário de MG