Causa perplexidade a audácia de alguns construtores que afrontam as leis e se empenham em lesar os compradores de unidades na planta. A Incorporadora Maio e a Construtora Paranasa deixaram de entregar os dois hotéis denominados Site Savassi, que deveriam estar em funcionamento desde março de 2014, e agora estão cobrando multas dos compradores que pararam de pagar pela obra, atrasada há cinco anos.
Mesmo estando os responsáveis pelas obras respondendo a diversos processos judiciais, têm a coragem de enviar, em 2019, notificações alegando que os compradores que já tenham pagado em torno de R$ 200 mil, caso não voltem a quitar as parcelas restantes necessárias para totalizar o preço de R$ 380 mil da unidade hoteleira, cobrarão dessas vítimas a multa rescisória de 20% mais 10% de despesas administrativas sobre o valor total do contrato. Isso mesmo! Além de não concluírem os hotéis, ameaçam cobrar mais de R$ 90 mil, como se a construtora e a incorporadora tivessem entregado os hotéis para a Copa do Mundo de 2014.
É incrível a afronta à boa-fé, pois a incorporadora/construtora, mesmo já tendo sido condenada em processos judiciais, continua recorrendo e se negando a devolver o dinheiro dos compradores que precisam dos recursos para utilizar em outro negócio. Há ainda a questão da enganação, pois foram iludidos com a promessa de que seriam donos de unidade hoteleira, quando na realidade não têm nenhuma propriedade nos termos do artigo 1.228 do Código Civil, já que são proibidos de ocupá-la ou locá-la diretamente. Em 2013, a Comissão de Valores Mobiliários esclareceu que “compradores” fizeram um mero “investimento coletivo”, ou seja, uma aplicação financeira, operação sujeita ao artigo 3, § 2º do Código de Defesa do Consumidor.
O fato é que a falta de atitude de vários compradores em exigir a rescisão do contrato de promessa de compra e venda – pois muitos ficaram abalados emocionalmente diante do golpe – tem dado margem a essa manobra da incorporadora tentar lucrar mais ainda com a desgraça que ela causou. Conforme o “Vídeo Assembleia Paranasa”, que está no YouTube, na reunião realizada em 29.09.14, o diretor da Maio, Jânio Valeriano Alves, confirmou que pegou emprestado o valor de R$ 80 milhões do banco, com patrimônio de afetação, tendo hipotecado os hotéis. Mas, apesar de ter recebido os pagamentos de mais de 300 compradores, desviou o empréstimo para outros negócios, o que é ilegal.
No final de 2018 faltavam R$ 25 milhões para terminar o empreendimento, tendo a incorporadora que pagar ainda a multa milionária para a prefeitura, em razão do atraso. Diante disso, são os compradores que têm direito a receber de volta tudo que pagaram, corrigido, acrescido de juros e multa, bastando agir. Entretanto, a construtora conta com a inércia dos compradores, que pode resultar na prescrição e, assim, ao final, não terá que devolver nada àqueles que pagaram por um sonho que virou pesadelo. Acordem, antes que seja tarde!
Esse artigo foi publicado no jornal O Tempo
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Conselheiro da Câmara de Mercado Imobiliário de MG e do SECOVI-MG
Diretor-adjunto em MG do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim)
kenio@keniopereiraadvogados.com.br