O valor de um imóvel está diretamente relacionado com o seu tamanho, ou seja, quanto maior mais elevado o preço, sendo as dimensões importantes para se comparar as outras opções de compra. Caso se trate de unidades que fazem parte de um edifício é fundamental que o comprador faça constar no contrato de promessa de compra e venda, em especial se estiver fazendo a aquisição na planta, todas as dimensões do apartamento, sala ou loja, bem como a sua fração ideal em relação ao terreno.
Entretanto, diante da realidade da maioria dos compradores não conferirem as metragens do imóvel, constata-se casos de construtor vende um imóvel com uma determinada metragem, mas o entrega com o tamanho menor, sendo que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou o entendimento de que o comprador do imóvel pode exigir abatimento proporcional do preço ou a rescisão do contrato quando a construtora entregar o imóvel num tamanho menor ao que foi prometido. Para evitar a alegação de prescrição é importante que o comprador promova a medição da unidade logo que receber as chaves da construtora, pois há caso de perda do direito por deixar de agir com celeridade e com a assessoria jurídica necessária para formalizar a reclamação de maneira que venha a acarretar uma condenação, se o problema vier a ser julgado num processo judicial.
Geralmente o contrato é redigido pela construtora de forma a protegê-la, deixando o comprador desguarnecido, que muitas vezes age com excesso de confiança ao adquirir um imóvel. Logicamente, seria um atestado de incompetência o departamento jurídico da construtora inserir cláusulas contra o interesse de seu contratante. Da mesma forma, consiste ingenuidade o comprador dispensar uma assessoria jurídica para equilibrar o contrato de maneira a reduzir seu risco.
Compreender a realidade dos negócios é fundamental para evitar surpresas, pois realizar uma transação de alto valor sem dominar as particularidades do negócio, contando apenas com a sorte e a confiança favorece a ocorrência de prejuízos. Não pode o contratante que agiu de forma relapsa colocar a culpa na imobiliária ou no corretor de imóveis, pois esses visam promover e estimular a conclusão do negócio, pois somente assim serão remunerados.
Os compradores devem entender que eles têm poder e o direito de refletir, avaliar os documentos atualizados e a redação do contrato com um especialista de sua confiança antes de assinar um compromisso. As construtoras, interessadas na conclusão do negócio, respeitam o comprador que busca assessoramento jurídico e aceitam inserir cláusulas que visam proteger os seus direitos, pois um contrato deve ser bilateral, claro e prestigiar a boa intenção das partes.
ABUSO x DIREITO
O artigo 500 do Código Civil (CC) estipula que quando um comprador adquire um imóvel “por medida”, denominado ad mensuram, ou seja, com determinados metros quadrados, somente poderá pedir abatimento proporcional do preço ou até rescindir o contrato se a diferença ultrapassar 5% do tamanho do imóvel.
O Ministério Público do Distrito Federal, ao perceber que, rotineiramente, determinada construtora de Brasília “errava” propositadamente a metragem até o limite de 5%, moveu uma Ação Civil Pública e conseguiu anular a disposição contratual que isentava tal construtora de indenizar o comprador no caso deste receber uma unidade com área menor do que aquela que constou no contrato de compra e venda.
Na ocasião, o STJ esclareceu que nos contratos imobiliários não prevalece o art. 500 do CC, pois se aplica o Código de Defesa do Consumidor, por ser lei especial. Apesar do Código Civil prever que possa haver pequena falha na medição, esta cláusula deve ser declarada nula de pleno direito quando se verifica que há abusividade por prever a exoneração da responsabilidade da construtora.
É ilícita a prática deliberada de redução das dimensões contidas nos contratos, em desacordo com aquelas fisicamente constatadas nos imóveis comercializados na planta ou em construção, conforme decidiu o STJ. Imagine que a construtora erre deliberadamente em dezenas de apartamentos de 200 m². A cada 20 apartamentos ela ganha um, auferindo assim lucro ilícito e muito representativo, além de penalizar o comprador.
Portanto, deve o comprador, bem como o inquilino no caso de uma locação, entender os tipos de medidas e conferi-las logo que tomar posse do imóvel, pois o seu valor decorre da metragem, sendo fundamental lealdade, fidelidade, transparência e coerência na realização dos negócios.
Esse artigo foi publicado no Jornal Diário do Comércio.
Kênio de Souza Pereira
Vice-Presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro da CMI-MG e do SECOVI-MG
Membro do IBRADIM – Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário
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