Muitas pessoas, ao comprarem imóveis caracterizados como “parte” ou fração” de terrenos, são mal informadas ou até ludibriadas, podendo se tornar num tormento para o comprador, caso não seja devidamente assessorado.
O comprador é movido pela emoção e acaba fazendo um negócio por impulso, ignorando que o fato da parte ou fração de lote/terreno, não estar desmembrada ou separada do seu restante, não é considerada juridicamente como um imóvel único, apartado, independente e sim um “pedaço” do todo. Ao adquirir parte ou a fração ideal de um lote, o comprador não sabe, mas está constituindo condomínio com uma ou mais pessoas coproprietárias do restante do terreno, na maioria das vezes desconhecidos. Depois se revender sem oferecer para estes, poderá ocorrer nulidade, já que o coproprietário tem preferência em relação a terceiros por se tratar de um condomínio geral.
O comprador não é instruído sobre as leis municipais que determinam a metragem quadrada mínima e metragem linear de frente necessárias para que o terreno possa ser desmembrado do restante e tornar-se um imóvel autônomo. Sem as instruções devidas, o comprador pode ser levado à erro e comprar um terreno impossível de ser desmembrado e regularizado. Haverá ainda o problema com o pagamento do IPTU, pois a guia é única e o não pagamento por algum ou alguns coproprietários gerará o protesto em cartório, a execução e até a penhora do imóvel negativando o cadastro até do coproprietário que desejaria pagar sua quota parte. Diante da falta de regularidade do parcelamento do terreno não há como o município emitir uma guia de parte do terreno daquele que deseja quitar o IPTU.
CONSTRUIR EM LOTE IRREGULAR É COMPLICADO
Há ainda o problema com a pretensão de edificar em parte do terreno, pois o proprietário do restante dele pode ter utilizado todo o coeficiente de aproveitamento (CA), ficando o comprador impossibilitado de aprovar um projeto para construir no local. Há ainda os riscos com problemas com os recuos obrigatórios também regidos pelas normas municipais, que podem restringir seu direito de construir.
Todas essas informações são de suma importância e deveriam ser repassadas pelo corretor de imóveis ao comprador antes do fechamento do negócio. Porém essa não é a realidade, pois há corretores que intermediam negócios sem necessário cuidado, visando apenas a comissão almejada.
CORRETOR DE IMÓVEIS RESPONDE POR NÃO INFORMAR
O artigo 723 do Código Civil é claro: o corretor deve esclarecer todos os pontos relevantes do negócio e de forma espontânea, sob pena de responder por perdas e danos.
Vejamos o texto da lei:
Art. 723. O corretor é obrigado a executar a mediação com diligência e prudência, e a prestar ao cliente, espontaneamente, todas as informações sobre o andamento do negócio.
Parágrafo único. Sob pena de responder por perdas e danos, o corretor prestará ao cliente todos os esclarecimentos acerca da segurança ou do risco do negócio, das alterações de valores e de outros fatores que possam influir nos resultados da incumbência.
Não adianta dizer que o cliente não perguntou ou que tinha pressa em fechar o negócio, pois a venda de um imóvel é sempre complexa e exige vários cuidados, especialmente quanto a documentação. O corretor, como expert, deve apontar e esclarecer todas as vantagens e riscos inerentes à compra de parte de um terreno que ainda não foi desmembrado do todo.
Portanto, confiar em informações verbais sem aprofundar na documentação, pode gerar a desvalorização do imóvel em até 50% do seu preço, além de problemas com uma possível rescisão do contrato ou mesmo com o pagamento da comissão de corretagem, sendo prudente ter uma consultoria jurídica caso o vendedor ou o comprador não dominem as questões técnicas e legais.
É importante analisar diversos pontos antes de assinar o contrato de promessa de compra e venda, em especial, o registro imobiliário e a certidão negativa de ônus atualizada, a guia do IPTU, a informação básica e no caso de dúvida, a planta do loteamento aprovada pelo município, além de outras particularidades que variam conforme o caso concreto.
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG (2010 A 2021)
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Diretor Regional em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário
Conselheiro do Secovi-Mg e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG