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AÇÃO RENOVATÓRIA FICARÁ MAIS DIFÍCIL PARA INQUILINO

     Um dos reflexos da pandemia que impôs as medidas de afastamento social que inviabilizaram o funcionamento de milhares de empresas – gerando dificuldade no pagamento dos aluguéis dos imóveis locados para os comerciantes e empresas que têm a necessidade de evitar o risco de mudar de local – será o aumento do insucesso ao proporem ações renovatórias de contrato de locação. São inúmeros os erros que os inquilinos estão cometendo ao atrasarem ou pagarem apenas parte do aluguel ou motivarem ações de cobrança, pois, ao final, poderão inviabilizar o direito à renovação do contrato de cinco anos.                       

     Várias são as empresas que têm como grande valor estratégico o local onde funcionam, pois caso venham a desocupar o imóvel perderão parte expressiva da clientela, a qual não acompanhará a empresa se mudar de endereço, além de deixar de obter o retorno dos investimentos em reformas, construções, publicidade e até de luvas, que nos shopping centers são denominadas “res sperata”, pagas pelo fundo de comércio ou ponto comercial.                       

     Esses inquilinos têm uma garantia valiosa que consiste no direito de requerer, a cada cinco anos, judicialmente ou amigavelmente, que o locador renove o prazo do contrato de locação, mesmo contra a vontade dele, ou seja, caso o locador deseje retomar o imóvel e assim encerrar a locação comercial, ele não conseguirá por meio da “denúncia vazia”, pois perdeu tal poder ao assinar um contrato com o prazo de cinco anos. Somente se o inquilino desejar mudar ou cometer uma infração legal ou contratual, terá o locador condição de reaver a posse do imóvel que lhe pertence. Há outras possibilidades de evitar a renovação, mas são muito difíceis o locador aplica-las. Essa perda de poder do locador retira dele a condição de impor o valor do aluguel, já que não poderá despejar o inquilino com o contrato por prazo indeterminado, ou seja, sem motivação. Isso gera, às vezes, uma enorme vantagem para o inquilino e um injusto prejuízo para o locador, que passa a receber um aluguel abaixo do preço de mercado quando o inquilino é inflexível.

     Portanto, a Ação Renovatória é um poderoso instrumento de segurança e estabilidade para a manutenção de milhares de negócios que funcionam em imóveis locados, pois grande parte do seu faturamento decorre do movimento de pessoas que residem, trabalham ou transitam no entorno daquele endereço.  Há casos que a empresa simplesmente “quebra” ao sair de determinado local, pois os clientes não se animam a frequentar o novo endereço.                       

     Ocorre que a ação renovatória prevista na Lei do Inquilinato consiste em um dos processos mais complexos no nosso ordenamento jurídico, pois envolve inúmeros procedimentos prévios para que possa o juiz conceder o novo prazo de cinco anos de contrato. São dezenas de possibilidades que levam o inquilino a perder a ação, pois é exigido do advogado grande domínio das questões imobiliárias, além das processuais dessa lei especial que regulamenta diversos tipos de processos. São várias particularidades que, se passarem despercebidas, resultam no indeferimento do pedido de renovação. E pior, conforme o art. 74 da Lei 8.245/91, não sendo renovada a locação, poderá o juiz de imediato, na mesma sentença, determinar a expedição de mandado de despejo que conterá o prazo de 30 dias para a desocupação.                       

     Portanto, o que está em jogo numa ação renovatória pode definir o sucesso ou até o fechamento do estabelecimento comercial, sendo lamentável o contratante (locador ou inquilino) tratar o assunto sem o devido cuidado, pois o amadorismo nas ações locatícias é imperdoável. Uma falha, acabou o processo! Não tem como corrigir e o prejuízo enorme poderia ter sido evitado se tivesse contratado o profissional não pelo menor preço, mas pela competência, pois na Lei do Inquilinato há desdobramentos inimagináveis para quem não atua diariamente no setor.                       

   Como exemplo, podemos citar que um dos erros mais comuns é deixar para negociar o novo prazo na última hora, pois o inquilino, visando economizar, não contrata advogado especializado e gasta, negociando, quase os 180 dias que a lei lhe concede para entrar com a ação. Ao final, quando resolve contratar o advogado, não haverá tempo hábil para montar o processo judicial e assim, perde o prazo ou o processo é distribuído no Fórum com falhas. Se fosse simples a ação, o legislador não teria dado 6 meses para montar o processo que deve ser proposto no início do 5º ano de contrato, conforme estabelece o art. 51, “§ 5º Do direito a renovação decai aquele que não propuser a ação no interregno de um ano, no máximo, até seis meses, no mínimo, anteriores à data da finalização do prazo do contrato em vigor”.                      

     Com a pandemia, constata-se um festival de erros praticados pelos inquilinos que motivaram ações de cobrança, “queimaram” a boa relação com seus fiadores, criaram confusões com negociações verbais que alteraram o valor do aluguel e geraram polêmicas e processos judiciais quanto aos pagamentos. Enfim, tais atos poderão ser utilizados pelos locadores para derrubarem a ação renovatória, havendo também casos em que os locadores praticaram atos indevidos por conduzirem uma locação altamente complexa de maneira superficial e sem a devida cautela.

 

Esse artigo foi publicado no Jornal Diário do Comércio

 

Kênio de Souza Pereira

Advogado – Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG

Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal

Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis

kenio@keniopereiraadvogados.com.br