Centenas de casas, lojas, galpões, apartamentos térreos ou de cobertura são vendidos por meio de financiamento, sendo que o vendedor recebe da instituição financeira o valor financiado na sua conta bancária somente após essa ter em seu poder a matrícula do imóvel constando o registro do Contrato de Financiamento que lhe transfere a propriedade com a garantia fiduciária. Ocorre que, ultimamente, alguns Oficiais têm negado o registro do contrato sob a alegação de que a área construída que consta na matrícula do imóvel é menor que a área realmente edificada. Sem esse registro o dinheiro do vendedor fica retido até que o imóvel seja regularizado, o que exige providências que demoram meses e custam caro.
Nos últimos três anos a Prefeitura de Belo Horizonte promoveu um levantamento, por meio de fotografias aéreas, de milhares de imóveis que sofreram acréscimo de área construída, atualizando a base de dados do IPTU e do ITBI, além de aprimorar a fiscalização de obras que não têm alvará de construção. A “nova” área construída, antes desconhecida pelo Fisco, aumentou a arrecadação ao passar a ser impressa nas guias do IPTU, bem como nas guias do ITBI no momento que ocorre a venda.
Essa atualização de dados não interfere na aprovação dos agentes financeiros, que continuam elaborando os contratos de financiamento, que têm força de escritura pública, nos quais é prevista a posse do comprador logo após este assiná-lo.
Entretanto, o Oficial do cartório, ao constatar a divergência de área construída maior, que foi acrescida após a concessão do Habite-se (denominado atualmente de Certidão de Baixa de Construção), tem agido com mais rigor, pois antes tal divergência de área não era checada. Vários são os casos de imóvel já financiado antes, com a mesma metragem, que não teve qualquer problema para ter o contrato registrado.
O vendedor atual, ao saber da Nota Devolutiva que exige um novo Habite-se, é surpreendido com a notícia de irregularidades (quando não tenha sido ele quem realizou as alterações), que ocasiona o atraso no recebimento do valor da venda, além de novos gastos com a regularização.
Regularizar implica na contratação de engenheiro ou arquiteto para aprovar o projeto, bem como o pagamento do INSS dos empregados que fizeram a obra. Isso pode demorar, ficando o dinheiro do vendedor retido no banco, inclusive, se tiver envolvido recurso do FGTS até liberação do registro do contrato.
Além das irregularidades nos dados do imóvel, os contratos de financiamento, e até as escrituras públicas são devolvidos pelos Oficiais Registradores por existirem conflitos nas informações sobre as partes envolvidas, como a falta de atualização do estado civil (pessoa divorciou e consta na matrícula que era casada), o que exige a apresentação do Formal de Partilha. Com a assessoria de um advogado especializado há maior acerto nas providências que visam atender os princípios informadores do direito registral imobiliário, dentre eles o da continuidade e da especialidade objetiva, sendo um erro conduzir o assunto tão complexo somente por meio de despachante.
Além do alto custo para regularizar a área construída supera o Coeficiente de Aproveitamento do terreno, há o risco de multas e conflitos com vizinhos ou com os condôminos. Caberá ao advogado da parte que o contratar analisar quem arcará com essas despesas, além de redigir o novo documento para ajustar as pendências. A situação poderá ser mais complicada se existir o risco do vendedor ter que pagar multa rescisória por não ter quitado outro compromisso, como a compra de outro imóvel, diante do bloqueio de seu crédito.
Cabe ao vendedor conferir se o imóvel está apto a ser financiado, não devendo esperar a realização desse trabalho complexo por parte do corretor de imóveis, pois esse tem como foco vender o bem, o que difere da função do advogado, que tem como objetivo proteger quem o contrata. Ao agir com precaução, evita-se aborrecimentos e prejuízos com a discussão sobre multas, comissão, juros e desvalorização do dinheiro que não foi liberado na data esperada.
Esse artigo foi publicado no Jornal Diário do Comércio
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Diretor da Caixa Imobiliária Netimóveis
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro do Secovi-MG e da CMI-MG