REGIMENTO INTERNO NÃO PODE AFRONTAR CONVENÇÃO
A convenção é a principal norma de um condomínio, sendo prevista pelo Código Civil, que determina em seus artigos 1.332 e 1.334 os assuntos que devem, obrigatoriamente, constar no documento que pode ser instituído e alterado somente com o quórum qualificado de 2/3 dos condôminos. Com o objetivo de eliminar erros ou lacunas na convenção, há condomínios que cometem o erro de inserir no regimento interno, normas que contrariam determinados artigos da convenção. Essa ilegalidade é cometida por aqueles que procuram evitar as várias exigências do Cartório de Registro de Imóveis para aceitar a alteração da convenção, além de se aproveitarem do fato do regimento interno exigir quórum menor para ser aprovado.
O que é assunto para a convenção?
Dentre as matérias tratadas na convenção, está o patrimônio dos condôminos, ao definir as áreas que pertencem a cada coproprietário – apartamento, sala, loja, garagem e as que são comuns a todos – área de lazer, hall, salão de festas, corredores, terraço e demais particularidades conforme o empreendimento. Por limitar o direito de propriedade, definir os quóruns para os diversos tipos de deliberação, formatar a realização da assembleia e definir o rateio de despesas, a competência para aplicação de multas, o percentual de juros a serem cobrados ao mês, as punições em decorrência de infração, além dos direitos e deveres, a convenção se assemelha a uma lei, e por isso exige quórum maior a fim de assegurar segurança jurídica.
Tamanha é a importância desse documento que o seu registro é realizado somente no Ofício de Registro de Imóveis, que se vincula à matrícula de cada unidade, possibilitando que todo proprietário tenha pleno acesso ao seu conteúdo. Quanto ao regimento interno esse não é aceito por este cartório nos termos da Lei nº 6.015/73 que estabelece:
“Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.
I – o registro: [….] 17) das incorporações, instituições e convenções de condomínio;”
Erro de inserir o regimento interno dentro do texto da convenção
O amadorismo na redação das convenções fica evidente nos diversos equívocos decorrentes do vício de se copiar modelos ultrapassados e de outros empreendimentos bem diferentes. A Lei nº 4.591/64 determina que a incorporadora ou construtora elabore apenas uma minuta de convenção, sendo que o ideal seria os compradores revisassem a mesma, como a devida assessoria jurídica, logo após receberem o edifício.
Um dos erros mais desastrosos e de difícil conserto decorre da inclusão indevida do “Regimento Interno” dentro do texto da convenção. Essa confusão acaba prejudicando extremamente centenas de edifícios, em especial os de grande porte, pois torna quase impossível alterar e modernizar o “Regimento Interno”, diante da necessidade absurda do quórum de 2/3 do condomínio.
Na prática, há edifícios com 300 apartamentos, com diversos equipamentos de lazer que necessitam de normas atualizadas, que são aperfeiçoadas com o passar do tempo para melhorar a convivência e validar a aplicação de multas. Se a convenção estabelece um quórum elevadíssimo para criar ou alterar o regimento interno o mais sensato seria revisar toda a convenção corrigindo os erros. Todavia, há condomínios que optam pela informalidade e promovem alterações no regimento sem obter o quórum previsto na convenção, agravando a ilegalidade ao inserirem no regimento normas que poderiam constar somente na convenção. Tal procedimento torna inválida algumas deliberações e punições aplicadas pelo síndico ou pela assembleia contra o condômino antissocial que infringiu o regimento, levando à improcedência processos judiciais de cobrança contra o morador devedor. O processo é julgado contra o condomínio por este ter criado um regimento novo com aprovação, por exemplo, de 50 votos, mas que diante da convenção imprópria, exige 200 votos, ou seja, o mesmo quórum exigido para se aprovar a alteração da convenção.
O que é assunto para o regimento interno?
O regimento interno é o documento que regula os assuntos do dia a dia dos condomínios, as questões rotineiras, tais como as atividades do porteiro, os horários para mudança dos moradores e regras de uso da piscina, quadra, sauna, salão de festas, garagem, etc.
Esse documento é registrado no Cartório de Títulos e Documentos, podendo ser alterado por quórum estipulado na convenção, podendo ser, por exemplo, o da maioria dos presentes. A utilização de quórum menor visa facilitar sua atualização sempre que necessária, pois suas regras precisam acompanhar o dinamismo do edifício, para regular situações novas que surgem com a ocupação do empreendimento, evitando, assim, problemas específicos. Entretanto, nenhum artigo do regimento pode se chocar com as disposições contidas na convenção, pois esta se sobrepõe ao regimento.
Prejuízos com regimento elaborado como se fosse convenção
Portanto, caso a assembleia aprove por meio do regimento o aumento dos juros acima de 1% ao mês, a forma do rateio de despesas ou quóruns para aprovar os diversos tipos de obras, que só podem ser regulamentados na convenção, tal ato é nulo, por ser ilegal. Essa falta de prudência e de técnica comprometem a administração do condomínio e inviabilizam os processos judiciais que são fundamentados no regimento carente de validade. É essencial corrigir essas falhas para melhorar o controle, inibir a inadimplência e os atos antissociais, pois uma boa convenção e o regimento valorizam o edifício ao tornar viável a sua condução de maneira eficiente.
Esse artigo foi publicado no Jornal Hoje em Dia
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal