A Lei n° 13.777 de 20/12/18 alterou o Código Civil para tratar do regime jurídico da multipropriedade, que regulamenta o parcelamento temporal de um imóvel para que cada coproprietário possa usá-lo durante um determinado período pré-definido. Esse tipo de negócio existe há décadas no exterior, sendo conhecido como time sharing, pelo qual em cidades como Orlando, Miami e Cancun se comercializa a utilização de hotéis e resorts.
A ideia é boa e certamente existem empresários e construtoras bem intencionados atuando na área. Porém, como de costume, no Brasil surgem os aventureiros que passam a iludir os turistas desavisados com promessas mirabolantes, utilizando-se de marketing agressivo e da falta de conhecimento sobre um tipo de negócio altamente complexo.
Em cidades como Gramado, Caldas Novas e Búzios, vendedores sem qualquer compromisso com o êxito futuro do empreendimento – pois inexiste estudo de viabilidade econômica e operacional – têm ofertado quotas de apartamentos em Resorts e Hotéis.
As abordagens ocorrem com o oferecimento de brindes atrativos, como jantares caros, ingressos para parques temáticos (que ao invés da Disney World, no Brasil é o parque Snowland em Gramado, dentre outros) e estadias em hotéis para que o cliente disponibilize seu tempo para assistir à apresentação de uma super equipe de vendedores. Os possíveis compradores são conduzidos a um local confortável, decorado, com profissionais de venda altamente preparados para criar um ambiente perfeito para seduzi-los com uma estratégia de marketing encantadora, o que não é ilícito ou irregular.
Entretanto, inúmeras reclamações no site “Reclame Aqui” demonstram que em muitos casos informações importantes não são fornecidas aos consumidores, pois o foco da apresentação é vender a ideia de “oportunidade única” para o comprador. Em vários casos o comprador é impedido de tomar notas dos dados e de utilizar uma calculadora, pois se fizer as contas perceberá o negócio não aquela maravilha, tanto é que não pode levar o contrato para casa para avalia-lo com calma. Assim, muitos adquirentes acabam comprando a quota de uma multipropriedade sem ter plena ciência da realidade do negócio.
Levados pelas ofertas aparentemente vantajosas, que são passadas aos clientes com ar de espetáculo, algumas vezes regado a espumantes, os consumidores deixam de verificar o básico. Em que estágio está a obra? É possível registrar o contrato no Ofício de Registro de Imóveis? O empreendimento tem incorporação registrada, está livre de ônus ou impedimento? Quem irá administrá-lo e qual a sua expertise? É viável financeiramente? E os custos dele desocupados? Sabemos que vários são os apart-hotéis que os proprietários têm que pagar as quotas de condomínio já que a taxa de ocupação não cobre nem os custos da operadora e de manutenção.
Não são passadas informações importantes antes de fechar o negócio, o que resulta em diversas reclamações e demandas judiciais que têm alto custo. Esses problemas seriam evitados com uma reflexão ou consulta a um advogado atuante na área imobiliária, pois este perceberia as falhas do contrato e da documentação do imóvel que não se compara com a estrutura dos empreendimentos vendidos nos Estados Unidos que fazem parte de uma cadeia hoteleira com centenas de opções.
Em breve, lamentavelmente, veremos compradores relatando em Juízo que estavam em férias e que pensavam que tiveram sorte ao receberem um brinde, que no final saiu muito caro.
Este artigo foi publicado no Jornal O Tempo.
Kênio de Souza Pereira
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