O COVID-19, além do risco à saúde, causou diversas mudanças na sociedade gerando reflexos nas negociações, em especial, na compra e venda de imóveis que envolve valores elevados que são pagos em parcelas ou financiados por agentes financeiros.
A pandemia acarretou queda expressiva da Bolsa de Valores, estando as aplicações financeiras rendendo menos de 4% ao ano, situação essa favorece o investimento em imóveis por ser seguro, livre dos riscos de empréstimo compulsório ou confisco. Porém, a aquisição imobiliária sempre exigiu cuidados especiais, sendo poucas as pessoas apta a compreender toda a documentação e pesquisa que torna a transação segura, pois a maioria dos negócios são fechados com base na confiança. O fato é que os milhares de processos judiciais que tramitam na Justiça, o contratante que se sente lesado, ao contar seu caso para o advogado confirma que fez a transação sem assessoria, pois desejava economizar, tendo contado com a sorte ou agiu de forma despreocupada ao pensar que caberia ao corretor de imóveis agir como se fosse seu advogado. Muitas pessoas ignoram que ao corretor cabe promover o negócio e ao advogado proteger o cliente, podendo em alguns casos até desaconselhar a transação por constatar problemas graves que o corretor não tem como aprofundar.
Contratos superficiais funcionam quando não existem problemas
Se tudo fosse fácil, se todas as pessoas fossem honestas, sensatas e tivessem o mesmo ponto de vista e senso de justiça, seriam dispensáveis os policiais, os advogados, os promotores e os juízes, pois não haveria conflitos, ou seja, o Fórum poderia ser fechado.
Mas a realidade é bem diferente, pois ainda impera a cultura de levar vantagem ou de omitir dados que podem desestimular uma compra. Por isso, as pessoas experientes, como os grandes empresários, nunca utilizam os modelos de contratos que são assinados de forma aleatória pelos descuidados, sendo esses viáveis apenas para os negócios mais simples, com pagamento à vista.
Diante das diversas possibilidades que podem ocorrer com a forma de pagamento parcelado, as nuances dos procedimentos, a posse, além das questões documentais, além do risco do surgimento de situações excepcionais, fica evidente a importância da experiência na redação do contrato para reduzir a possiblidade de surpresas. Basta vermos as complicações causadas pela pandemia que não tem data para acabar, tendo há algum tempo ocorrido outras surpresas como a maxi desvalorização da moeda, a crise americana de 2008, além dos vários pacotes econômicos de 1984, 1986 e 1990 com regras mirabolantes, dentre outros eventos.
Multa excessiva poderá ser discutida em alguns casos
É comum compradores e vendedores fazerem constar no contrato uma multa de 10 a 20% sobre o valor do negócio a ser paga por aquele que descumprir alguma cláusula pactuada. Porém, em um período conturbado em razão do coronavírus, haverá o aumento da discussão em juízo sobre a aplicabilidade ou não desta multa, pois dependendo do impacto sofrido por uma das partes do contrato com prejuízos decorrentes do isolamento social, podem existir elementos para motivar o afastamento da cláusula em caso de desfazimento do negócio, especialmente se depender de eventos futuros.
A assessoria jurídica especializada nunca foi tão essencial, pois a elaboração de um contrato técnico, preciso e apropriado para cada caso concreto eliminará dúvidas e poderá evitar um litígio. Não é justo exigir da imobiliária a previsão de situações que exigem conhecimento de profissionais habituados a enfrentar demandas judiciais, as quais os preparam para elaborar soluções que evitem os conflitos que eles enfrentam no dia a dia na Justiça.
Novas situações e soluções devem ser previstas
O que fazer se o Ofício de Notas tiver que fechar emergencialmente em razão do coronavírus e a escritura de compra e venda não puder ser assinada? Como ficam os prazos de pagamento caso o agente financeiro deixe de fornecer o crédito aprovado? E se os juros do financiamento, antes aprovado em 7% ao ano sofrer um aumento repentino? Esses são apenas alguns exemplos das várias situações que podem ser previstas no instrumento contratual de modo a proteger as partes, tornando segura a relação negocial em um tempo de imprevisibilidades. O copiar e colar para elaborar um contrato tem motivado muitos conflitos judiciais para aqueles que contam com a sorte.
Investir em imóveis é uma ótima opção, ainda mais perante tanta volatilidade e dúvidas com as ações e os valores depositados nas instituições financeiras diante um governo que está gastando bilhões de reais que não foram previstos no orçamento.
Esse artigo foi publicado no Jornal Hoje em Dia
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Vice-presidente da Comissão Nacional de Direito Imobiliário da OAB Federal
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário – Ibradim-MG
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