Com a tecnologia os condomínios evoluíram com vários deles passando a gravar em vídeo e áudio das assembleias para que haja maior segurança sobre o que é deliberado. Os condomínios que têm gestão profissional entendem ser fundamental redigir a ata no decorrer da assembleia, especialmente se for de grande porte, sendo utilizada a gravação para evitar questionamentos judiciais decorrentes de atas que não reproduzem exatamente as manifestações dos condôminos e seus procuradores.
A tendência da realização das assembleias por meio eletrônico tem motivado as construtoras e os advogados especializados em Direito Imobiliário inserirem nas convenções novos procedimentos como o envio do edital por e-mail e o direito de qualquer condômino ver posteriormente a gravação, pois essa estimula a lisura e o registro dos debates e posições com fidelidade. No caso de algum abuso, a gravação impede que a apuração seja frustrada, porque às vezes, temos apenas a palavra de uma pessoa contra a outra.
GRAVAÇÃO INIBE O COMETIMENTO DO CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA
Somente o mal intencionado, que visa fraudar a ata, inserir o que não foi dito, subtrair ou distorcer um argumento, é que cria problema para que a reunião seja gravada. Teme que seja provado o crime de falsidade ideológica previsto no art. 299 do Código Penal. Esse ilícito é cometido rotineiramente por falta de denúncia, podendo qualquer condômino dar início ao processo criminal, pois tal ato certamente o síndico e o secretário ao serem processados criminalmente passarão a redigir a ata na hora e a inserir tudo que for solicitado. .
Art. 299 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de um a três anos, e multa, de quinhentos mil réis a cinco contos de réis, se o documento é particular.
NINGUÉM PODE IMPEDIR A GRAVAÇÃO
Não existe lei que impeça uma pessoa de gravar aquilo que lhe interessa e que terá que ser reduzido na ata a termo, não tendo que pedir autorização ao síndico ou à assembleia. É um direito que não pode ser obstado pela assembleia, pois a lei não autoriza impedir o registro dos fatos, conforme várias decisões dos Tribunais Estaduais, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal (STF).
A ministra Ellen Grace como relatora, no julgamento unânime do RE 402.035-AgR, no Supremo Tribunal Federal, sobre a legalidade da gravar, decidiu:
“Gravação de conversa. A gravação feita por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, nada tem de ilicitude, principalmente quando destinada a documentá-la em caso de negativa. Precedente: Inq 657, Carlos Velloso. Conteúdo da gravação confirmada em juízo. AGRRE improvido”.
Os julgamentos no Conselho Nacional de Justiça, no STJ e no STF são gravados, sendo inclusive os do STF transmitidos pela TV. O direito de gravar está previsto no art. 417 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973, que no caso das assembleias inibe as fraudes.
Por se tratar de assembleias de condomínio não se questiona o direito de imagem, pois essas gravações são realizadas entre os condôminos, para serem vistas por eles ou em casos especiais num processo judicial, caso seja necessário provar a exatidão do que conta na ata. É portanto lícita a gravação por ser particular, em prol da segurança do condomínio e por não se destinar à exposição pública dispensa prévia autorização dos presentes à reunião.
LEI DE 2015 CONSAGROU GRAVAÇÃO EM VÍDEO
Com os processos eletrônicos, a Lei nº 13.105/2015, (CPC) avançou ao consagrar nos artigos 376 e 460 a gravação, inclusive, por vídeo nas audiências, o que implica nas assembleias que são atos públicos, tanto é que as atas destas são posteriormente registradas no Ofício de Registro de Títulos e Documentos.
Vejamos o novo CPC, art. 367, nos seus parágrafos 5º e 6º: “§ 5º A audiência poderá ser integralmente gravada em imagem e em áudio, em meio digital ou analógico, desde que assegure o rápido acesso das partes e dos órgãos julgadores, observada a legislação específica. § 6º A gravação a que se refere o § 5º também pode ser realizada diretamente por qualquer das partes, independentemente de autorização judicial.”
Cabe ao condomínio promover a digitação de imediato da ata e, na falta do síndico, a qualquer condômino que poderá ser o secretário, evitando a redação posterior que configura relatório, pois este é que registra fatos passados. A essência da ata é o registro no decorrer da reunião, como o faz o juiz ao colher um depoimento, tendo esse documento a finalidade de registrar fielmente as manifestações dos participantes.
Belo Horizonte 13 março 2020
Este artigo foi publicado no Jornal O Tempo.
Kênio de Souza Pereira
Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG
Conselheiro do Secovi-MG e da Câmara do Mercado Imobiliário de MG
Vice-presidente da Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB Federal
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim-MG)